Não estamos aqui para uma sessão de terapia e muito menos autoajuda. Vamos falar dos dias, mais precisamente das possibilidades que existem em concentrarmos nossos esforços de captação de recursos em um determinado dia do ano. Esse tema surgiu quando comecei a pensar no #diadedoar este ano e nas várias outras iniciativas que já existem ou que estão pipocando pelo mundo, tendo como estratégia a concentração de esforços. Vamos antes fazer uma reflexão, pra entrarmos no clima.
Todo mundo conhece o Teleton e o Criança Esperança certo? E é unanimidade que se formos analisar o motivo do sucesso dessas iniciativas, todos dirão que tem a ver com a força da TV.
Eu poso dizer isso com certa segurança, pois faz anos que faço perguntas em minhas aulas sobre esses casos. Os alunos dizem que não dá pra comparar a força das TVs com uma iniciativa local. E eu concordo. Mas quando começamos a conversar mais, esmiuçar as estratégias, vamos chegando a novas conclusões.
Também funciona porque existem artistas famosos que estão lá naquele dia. Mais ainda, estão lá, pedindo, objetivamente. Não estão lá somente fazendo suas apresentações musicais. E se as fazem, ao final do pequeno espetáculo, conversam com o apresentador da vez, e ambos conversam sobre a importância de participar e… pedem. Pedem claramente: liguem para o número tal e tal.
Nessas 24 horas de programação, há um esforço concentrado para conseguir o máximo de doações. Todos que estão assistindo aquele canal estão sendo bombardeados para agir e doar. Assistem também a vários artistas, mas todos, em todos os momentos, estão focados em arrecadar dinheiro.
No caso do Teleton, cuja renda vai para a AACD, a iniciativa arrecada muito mais do que os esforços que ocorrem durante todo o ano. Ou seja, não é que a AACD fica quietinha esperando chegar o dia do Teleton. Ela trabalha e muito durante o ano. Mas nada se compara com a força da TV, dos artistas e do esforço concentrado.
Vamos pensar em outro exemplo. Te dou 2 minutos pra pensar um caso brasileiro onde um dia por ano se arrecada em todo o Brasil, milhões de reais. Ei! Você não esperou os 2 minutos! Pare e pense um pouco, pessoa curiosa!
Ok, se você parou pra pensar, descobriu: cancer. Você que não sacou ainda, nem com essa dica conseguiu? Ok, te darei outra, agora você vai lembrar: Big Mac. Sim! O MacDia Feliz. Não há TV, não há artistas. Sim, concordo contigo que há outdoors e faixas, mas a operação é descentralizada, cada ONG que lida com cancer nas cidades, em parceria com a filial do McDonalds local, tem suas estratégias para conseguir o máximo de sucesso nesse dia, fazendo com que se venda o maior número de bigmacs.
Eu acho essa operação muito bacana, por ser descentralizada nas funções e até distribuição dos recursos, mas é centralizada em uma coisa: data. A filial de Porto Velho e a de Mogi Mirim tem as mesmas possibilidades de arrecadação e mobilização. Pode ocorrer (e ocorre) de algumas filiais não conseguirem muito engajamento, ou até uma cidade não ter alguma ONG local que atua com a causa do combate ao cancer, mas não importa, a oportunidade está lá, todo ano. Podem arrecadar 5 reais ou 5 milhões. A força daquele dia é fundamental no sucesso da operação descentralizada.
E voltando ao #diadedoar, quando o criamos no Brasil, nosso objetivo era influenciar e contribuir para um aumento da cultura do doar em nosso país. Hoje em dia essa iniciativa está irmanada com outras pelo mundo inteiro, é no mesmo dia em qualquer dos países. Imagine um Criança Esperança no mundo inteiro. Só que ainda melhor, porque o dinheiro não está centralizado. E é mais distribuido ainda que o MacDia Feliz, pois é para todas as causas, não tem caixa único, nem caixa tem. O foco é convencer as ONGs a aproveitarem esse dia e desenvolverem uma ação que, por ser no dia de doar, seja potencializada.
E volto ao começo do artigo. Estava eu pensando sobre o #diadedoar este ano e o que poderia já escrever a respeito, e me veio a seguinte ideia: que bacana seria que daqui uma década o dia de doar tivesse inspirado milhares de ONGs a criarem também o SEU dia de doação, para elas mesmas. E assim saberíamos que além dos esforços de captação dessas entidades, haveria um dia especial onde todos nós soubessemos que aquele é o dia daquela ONG.
Fico imaginando a situação: “Oba, amanhã, primeiro sábado de outubro, dia nacional de doar pro Greenpeace!” ou “Chegou a carta da creche São Joaquim, pedem pra doar pra eles no dia mundial do santo!” ou ainda “Vou aproveitar que os Bikers do Capão me avisaram que é terça que vem é dia mundial do ciclista e vou doar pra eles!”.
Pelo lado do doador, tudo fica mais fácil. Mas pra ficar mais fácil pra ele, nós temos que arregaçar as mangas e fazer acontecer. Concentrar-se num dia determinado, focar na meta que se pretende alcançar, deixar materiais a postos, avisar com antecedência, fazer os agradecimentos logo no dia seguinte. Eu aposto que isso vai gerar muito dinheiro pra sua organização.
Que tal começar com um teste, nesse próximo dia de doar? Você tem a vantagem de embarcar em uma campanha mundial, que estará no ar. Cabe a você falar com seu público, prepará-los para que no dia doem a você. Crie algo interesante. Não se contente com uma chamada pra virem doar no dia. Isso é pouco. Crie uma ação, desenvolva uma atividade para os doadores.
Esses dias são ótimos também ora criar engajamento e pertencimento. Aquelas pessoas que estão sempre por perto, doam quando você pede, comprar o ingresso pro jantar, aparecem quando você chama voluntários. Essa turma toda é excelente pra ajudar e pra chamar novos apoiadores.
Vai ter um dia que você vai perceber que isso funciona. Terá chegado seu dia.