A narrativa, ao longo da história, evoluiu como uma ferramenta poderosa para a interação humana. Desde os tempos em que as pessoas se reuniam em torno do fogo para compartilhar experiências até os dias atuais, em que as redes sociais moldam nossa forma de interação, as histórias têm sido a essência da comunicação, principalmente quando falamos em causas sociais. Para contar boas histórias, é preciso planejamento e os roteiros ajudam a construir narrativas que não apenas informam, mas também despertam emoções, educam e mobilizam.
O que são roteiros
Um roteiro é um documento que descreve a estrutura, diálogos, ações e outros elementos necessários para contar uma história. Ele serve como um guia para transformar uma ideia ou conceito em um produto. Tem objetivos claros e conteúdo organizado de forma lógica para facilitar o entendimento. Pode ser usado desde a criação de vídeos institucionais até os vídeos curtos de Tik Tok.
Se a comunicação ocorre entre pessoas, é possível ter um roteiro envolvente também em uma conversa ou até mesmo em uma reunião com investidores. “Mas ele só se torna interessante quando traz significado, quando conseguimos atribuir significado a essas pessoas”, destaca Marco Iarussi, cofundador da Curta Causa, produtora de vídeos voltada para o terceiro setor. Quando alguém se identifica com a causa, torna-se parte dela e, consequentemente, pode contribuir.
No contexto da captação de recursos, os roteiros ajudam a tornar a narrativa mais envolvente. Transformam dados frios em relatos cativantes, apresentando não apenas os desafios enfrentados pelas comunidades, mas também destacando como as doações podem fazer a diferença. Embora a pessoa encarregada da captação de recursos possa não ser uma produtora de vídeos, pode usar os conhecimentos em roteiro para desenvolver campanhas com a equipe de comunicação ou até para preparar apresentações direcionadas a potenciais investidores. A narrativa coesa e envolvente fornecida por um roteiro bem elaborado conquista a atenção do público, constrói confiança e comprometimento.
Conteúdo que educa
Diante do constante bombardeio de informações na internet, é preciso superar o desafio de criar mensagens que se destaquem, que capturem a atenção das pessoas e ressaltem a importância da causa. “Ao colocarmos conteúdo na internet, não importa sobre o que estamos falando, o que chamará a atenção das pessoas é o que elas aprendem com isso. Assim, a maneira como uma organização social educa as pessoas torna-se de extrema relevância”, ressalta Tati Vadiletti, cofundadora da Curta Causa.
Para alcançar mais pessoas, também é preciso “sair da bolha”, ou seja, não só falar com quem já conhece a organização e a causa, mas também para outros grupos, abordando aquilo que pode parecer óbvio para nosso entorno, mas que é novo para outras pessoas. “Na internet, não há fronteiras, você se comunica com qualquer pessoa, em qualquer lugar que ela esteja. Dessa forma, estamos educando as pessoas, falando minimamente sobre a causa social que defendemos”, afirma Tati. “Conduzir o conteúdo para a reflexão conquista de maneira genuína aqueles que nunca ouviram falar sobre sua causa.”
Despertar emoções
“Uma boa história contada e uma história que emocione tem uma propensão 50% maior de captar recursos”, destaca Marco. Ele lembra que um estudo feito nos Estados Unidos com os vídeos que mais viralizaram nas redes sociais identificou cinco elementos comuns entre eles: inspiração, afeto, amizade, entusiasmo e felicidade. Esses elementos são considerados impulsionadores de engajamento e compartilhamento nas redes sociais. Vamos analisar brevemente cada um deles:
Inspiração: Narrativas inspiradoras têm o poder de motivar e mobilizar as pessoas. Histórias que mostram superação, conquistas ou transformações positivas muitas vezes atraem a atenção do público.
Afeto: A conexão emocional é fundamental. Narrativas que despertam emoções como amor, empatia ou compaixão têm mais chances de tocar o coração do público.
Amizade: Elementos que destacam relações sociais e conexões interpessoais podem criar uma sensação de pertencimento. Vídeos que promovem a amizade e a união muitas vezes são bem recebidos.
Entusiasmo: A energia positiva e o entusiasmo podem ser contagiantes. Conteúdos que transmitem alegria, animação e otimismo têm mais probabilidade de atrair a atenção.
Felicidade: Narrativas que evocam sentimentos de felicidade e satisfação tendem a ser bem recebidas. As pessoas gostam de compartilhar conteúdos que as façam se sentir bem e que possam espalhar alegria.
Engajamento nas redes sociais
Ao explorar a dinâmica das redes sociais, Marco Iarussi explica as mudanças nos algoritmos e como as plataformas buscam a interação para medir a qualidade do conteúdo. “Precisamos lançar algo que desperte nas pessoas o interesse em participar, compartilhar e comentar, já que as redes sociais buscam a interação para avaliar a qualidade desse conteúdo.
Tati sublinha a necessidade de avaliar o valor do conteúdo compartilhado nas redes sociais, observando que o engajamento pode ser medido pela relevância percebida. Isso significa, por exemplo, que se as pessoas salvam o conteúdo, é porque consideram importante o suficiente para revisitar ou compartilhar com outros.
A criação do roteiro
O roteiro começa na identificação de uma boa história para contar e a potencialidade dessa história está na transformação gerada na vida de uma ou mais pessoas, criando um clímax ao revelar o movimento pelo qual a pessoa passou ao sair do A para o ponto B. Essa transformação é o impacto gerado.
Para identificar a história, Marco e Tati recomendam responder perguntas como: “Que desafio você teve?”, “Quais foram as necessidades que motivaram?”, “Como você buscou superar esse desafio?”, “Que sucesso você teve nessa jornada?”, “Qual impacto isso tem na sua vida hoje?”. O resultado deve conter os seguintes elementos-chave:
Personagem: uma pessoa com quem o público possa se identificar.
Conflito: ilustra o problema que o projeto social pretende resolver.
Transformação: é promovida pelo projeto ou pela organização.
Chamada para ação: convidando as pessoas a se envolverem com a causa.
Para exemplificar, os fundadores da Curta Causa indicam assistir ao vídeo da campanha solidária para apoiar o tratamento da bailarina Marina Abib, que foi diagnosticada com uma doença rara que a fez perder força muscular em todo o corpo. A narrativa da campanha Marina em Movimento gerou inúmeras mobilizações e destaque na imprensa
O roteiro deve capturar a atenção, apresentar o problema, oferecer a solução e, finalmente, destacar a transformação alcançada, culminando em uma chamada de ação persuasiva.
“Fazer roteiro é treino. Treinando bastante, vocês vão pegando a noção do que é que é para fazer exatamente. E aí vocês conseguem escrever uma legenda para um post, mesmo que sucinto, porque não precisa ser gigante, pode ser um texto, um e-mail, uma conversa em uma reunião, um telefonema, um post ou um vídeo. O roteiro serve para inúmeras formas de se comunicar”, conclui Tati.
As dicas foram dadas durante o II Encontro de Comunicação e Captação de Recursos, evento on-line e gratuito realizado pela ABCR em parceria com a Escola Aberta do Terceiro Setor e a Rede Filantropia.
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Texto publicado pela Captamos, editoria da ABCR de conteúdos aprofundados sobre mobilização de recursos para causas