Quando pessoas entusiasmadas se reúnem e se organizam para solucionar problemas criam mudanças positivas no mundo. Segundo Paul de Gregorio, fundador da Rally, que desenvolve ações por um mundo mais justo, saudável, seguro, verde e igualitário, os seres humanos são capazes de grandes conquistas, mas nem sempre percebem o tamanho do poder que possuem.
“Vemos nosso papel no ecossistema do grupo de campanhas sociais como o de promover abordagens que buscam mostrar às pessoas que elas têm poder, encontrando maneiras de lhes dar confiança, habilidades e os recursos para que possam liberá-lo e usá-lo para promover a mudança em que acreditam”, explica.
Não faltam exemplos de ativistas e movimentos que decidiram agir para despertar a atenção da sociedade para questões urgentes. Entre eles, está a ativista ambiental Greta Thunberg, que começou a protestar em frente ao Parlamento sueco para exigir medidas em defesa do meio ambiente. Na época, ela tinha oito anos; hoje, Greta lidera o movimento Fridays for Future – também conhecido como Juventude pelo Clima, Greve Global pelo Clima, entre outros nomes – um movimento internacional de estudantes que realiza manifestações às sextas-feiras em defesa do meio ambiente.
Muitas organizações da sociedade civil foram formadas por pessoas que agiram para tentar solucionar um problema e compartilharam suas ideias políticas, sociais e artísticas. Paul acredita que o Terceiro Setor deve extrair o máximo proveito dessa capacidade de mobilização e usar ferramentas digitais para incentivar as pessoas a doarem muito mais do que dinheiro, mas outros recursos valiosos como tempo, habilidades e suas vozes.
“Somente a captação de recursos não mudará o mundo. Não estou dizendo isso para causar polêmica ou para sugerir que a captação de recursos não é uma profissão extremamente importante. Estou dizendo isso porque acredito piamente que as pessoas podem desempenhar um papel muito maior na visão da sua organização do que simplesmente financiá-la”, afirma.
“Na Rally, acreditamos que inspirar as pessoas a dividir seu tempo, seu dinheiro e suas vozes é um caminho para atingir os objetivos da organização com mais rapidez e eficiência. Organizações que apenas buscam o dinheiro do público estão perdendo o potencial de pessoas que podem ajudá-las a ter sucesso”, complementa Paul.
Ele defende modelos de mobilização digital que integram captação de recursos, comunicação, ativação da marca, campanhas e defesas de direitos e criam oportunidades para que o público se envolva conforme suas necessidades e energia. Não se trata apenas de realizar campanhas de captação de recursos, mas de perceber que as pessoas podem apoiar uma organização de várias maneiras e encorajá-las a participar ativamente de diversas ações que fazem parte da missão e das metas das entidades.
Para implementar essa estratégia, as entidades devem responder ao seguinte questionamento: “Qual é a melhor coisa que o público poderia fazer conosco hoje para apoiar nossa visão?”
“O que você faz é um reflexo de quem eles são e como querem que a sociedade seja. Eles querem agir com você e não para você. Somos grandes defensores da promoção da missão e de valores em vez de produtos, pois buscamos atrair o apoio do público”, afirma.
Um dos passos para convencer o público a participar ativamente de uma causa é comunicar os valores da organização para, posteriormente, decidir como cada indivíduo poderá contribuir com ela. Paul cita a campanha do senador norte-americano Bernie Sanders em 2016, quando ele concorria à presidência dos Estados Unidos. Na página inicial da campanha, havia uma frase impactante: “Ninguém que trabalha mais de 40 horas por semana deveria estar vivendo na pobreza”.
A declaração ousada e sucinta resume os valores da campanha e do candidato. A campanha não pede que o público se inscreva ou preencha um formulário, mas o instiga a concordar, incentivando uma resposta baseada em valores. Dizer algo e pedir para as pessoas concordarem é uma estratégia que estimula as pessoas a participarem da campanha e da conquista desses valores.
De acordo com Paul, a maioria das organizações possui uma linguagem autocentrada e se coloca entre o problema e a solução. A comunicação é feita de forma vertical e transmite a mensagem: “Nós, a organização, vamos mudar o mundo”, alimentando uma lógica de que o público oferece os recursos para que as ações sejam realizadas sem ele.
“Acreditamos que, para mobilizar de maneira eficaz, você precisa criar o grande ‘nós’, adotando um enquadramento mais horizontal. Você precisa colocar o leitor como parte da solução, não apenas como um fornecedor de recursos, mas como alguém fundamental para o problema ser resolvido. Em termos horizontais, ficaria algo como: ‘Só podemos resolver este problema trabalhando juntos e aqui está a forma pela qual você pode causar impacto’, exemplifica.
A maior parte das comunicações ocorre pelos meios digitais, por isso as organizações precisam dominar esse universo, saber em que se concentrar e melhorar aspectos que geram mais valor em termos de campanhas, ação, voluntariado, recursos etc. O objetivo de cada instituição deve ser o de formar uma equipe interna de alto desempenho para elaborar e disseminar conteúdos cada vez mais relevantes para seu impulsionamento.
Engajar o público em escala é crucial para provocar mudanças. Quanto mais pessoas forem alcançadas pela missão e pelos valores das organizações, melhor. Para que isso aconteça, Paul aconselha que as instituições se concentrem em comunicar ações específicas em vez de várias comunicações segmentadas em diferentes perfis de público. Isso não significa ignorar os dados sobre a audiência da organização, mas encontrar maneiras de inspirar e se comunicar com pessoas que têm uma visão neutra sobre a causa ou que são aliadas passivas, ou seja, que estão cientes do problema, mas não agiram.
Um case bem-sucedido é o da Refuge, instituição beneficente que combate a violência doméstica sediada no Reino Unido. A organização dependia muito do financiamento do governo nacional e local e queria ser mais ativa e desafiadora em relação às causas da violência doméstica e às leis que precisavam ser alteradas para proteger os sobreviventes. Seu desafio era saber como aproveitar o poder e a energia do movimento feminista.
A Rally criou uma estratégia cujo objetivo era melhorar muito o desempenho digital da organização e incorporar a mobilização digital. Foram definidos quatro pilares: mensagem e valores, atração e aumento do tamanho da comunidade, crescimento do número de ações feitas pela comunidade e a autossuficiência era a meta de longo prazo da Refuge.
No ano anterior ao trabalho da Raly, a Refuge arrecadou cerca de 300 mil libras online. Depois de 12 meses de parceria, a arrecadação foi de 700 mil libras online e, após dois anos, de 5,2 milhões de libras.
“Fizemos muitas coisas para promover essa mudança radical no desempenho. Uma das principais foi definir o que chamamos de história do movimento. Conduzimos um projeto que proporcionou uma articulação convincente, inspiradora e muito simples de quem é a Refuge, qual é a escala do problema que está tentando resolver, quem ou o quais são os obstáculos, como a Refuge planeja superá-los e qual é o papel que o público pode desempenhar para atingir esse objetivo conosco. A história do movimento traz clareza e consistência na maneira como isso é contado para atrair o apoio do público”, relata Paul.
Entre as várias mudanças propostas para a organização, destaca-se a reformulação nos e-mails, que eram enviados trimestralmente. Não havia um foco nesse meio de comunicação e, além disso, a poluição visual causada pelo excesso de links e imagens chamava atenção. A Rally passou a enviar e-mails semanalmente e com apenas um foco. Cada e-mail falava de um assunto e continha diferentes solicitações como doações, participação em campanhas, compartilhamento de conteúdo.
O poder da lista de e-mails ficou evidente e conseguiu ajudar a Refuge a mudar a legislação para ajudar vítimas da violência doméstica no Reino Unido. A primeira campanha feita pela organização era um apelo para o governo adotar medidas que tornassem ilegal o compartilhamento de imagens íntimas sem consentimento. A organização pediu que seus apoiadores e o público em geral enviassem um e-mail ao governo para pressionar as autoridades e os resultados foram tão bons que originaram um movimento em escala e de geração de receita. O foco era incentivar o envio do e-mail, mas dentro da experiência do usuário havia também um pedido de doação. O total arrecadado foi de 45 mil libras.
As dicas foram compartilhadas durante o Café ABCR
Texto publicado pela Captamos, editoria da ABCR de conteúdos aprofundados sobre mobilização de recursos para causas