Nos últimos anos o debate sobre a diversidade nos mais diferentes espaços se intensificou e o trabalho na captação de recursos para o terceiro setor não está livre destes questionamentos. Somente com múltiplos olhares, vozes e experiências é possível alcançar objetivos e fortalecer a área social. Para que isso aconteça, no entanto, é urgente o processo de autoconhecimento e mudanças efetivas para garantir que haja diversidade em todas as atividades de doadores, passando pela equipe interna até chegar às campanhas de marketing.
Organizações da sociedade civil (OSCs) têm um papel histórico no combate aos diversos tipos de preconceitos. Perpetuar desigualdades, portanto, vai na contramão desta trajetória. Iniciativas que investem em uma equipe de captação diversa só têm a ganhar, ainda mais porque um bom resultado não está relacionado unicamente às habilidades técnicas. Estabelecer conexão com pessoas doadoras e potenciais apoiadoras passa pelo reconhecimento e pela representatividade. Quem está do outro lado, se enxerga em quem faz a captação? Quem está na captação se enxerga nas lideranças da OSC? Essas são algumas perguntas de um universo que inclui questões como:
Fazer questionamentos constantes é o primeiro passo para fazer mudanças efetivas. Em artigo sobre diversidade e inclusão na filantropia em saúde (e as reflexões valem para demais áreas), Angelique Grant e Ronald J. Schiller afirmam que “equipes diversas têm mais compreensão, experiência e perspectiva, permitindo que sejam mais criativas sobre como alcançar mais doadores e engajá-los mais profundamente”.
Outro ponto levantado pelos autores é que muitos esforços na diversidade em organizações filantrópicas falham porque a razão motivadora por trás é que essa “é a coisa certa a fazer”, mas a reflexão precisa ser mais profunda. “Lideranças devem primeiro entender e concordar que a diversidade é fundamental para o cumprimento da missão”. Segundo eles, com um entendimento real do porquê a diversidade é importante, “se criará a mudança mais sustentável em sistemas e comportamentos para criar um ambiente verdadeiramente inclusivo”.
Mulheres na captação
Uma inclusão efetiva vai além de números, passa por discussões sobre comportamentos que reforçam estereótipos e violências. No caso das mulheres captadoras, por exemplo, há relatos sobre o desafio de lidar com assédios tanto no ambiente interno quanto no externo. “Não podemos normalizar esse tipo de comportamento, seja do seu gestor, do seu parceiro. Precisamos estar atentas”, afirmou Helen Pedroso UN Pacto Global Rede Brasil durante debate sobre o tema realizado durante o Festival ABCR 2021.
Para Tabatha Benitz, do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM), ainda que as mulheres sejam maioria na captação de recursos, ainda maior participação delas na liderança das organizações. “O que eu observo é que, não só na captação, mas também nas atividades que envolvem negociações ou tomada de decisão, quem toma as decisões, no fim das contas, são os homens. A gente acaba ficando nos bastidores (…) Quando a gente traz a equidade de gênero para o debate, estamos falando sobre mudar essa estrutura a longo prazo”.
Para oferecer acolhimento e ações colaborativas entre as profissionais da área, Ana Flávia Godoi (conselheira da ABCR), Renata Linhares (gerente de Relacionamento da Sitawi Finanças do Bem) e Flavia Lang (associada da ABCR) fundaram a rede Conexão Captadoras, que também incentiva o intercâmbio de conhecimentos e vivências femininas na profissão. “A gente quer debater sobre isso e criar cada vez mais espaços democráticos de lideranças para todas nós e espaços onde a gente possa ser escutada e crescer na profissão”, explicou Ana Flávia.
Diversidade nas campanhas
A postura em prol da diversidade também deve estar presente nas campanhas de captação de recursos. Vale dizer que a comunicação deve ser coerente com o discurso institucional e expressar aquilo que, de fato, acontece. A partir dessas bases, equipes de captação e marketing devem analisar as mensagens utilizadas para identificar falas que podem expressar algum tipo de preconceito, explícita ou implicitamente.
Os elementos visuais também precisam ser considerados. Elas incluem públicos diversos? Por exemplo: em uma campanha para aumentar as doações recorrentes, as imagens utilizadas incluem pessoas com deficiência? Para quem depende de banco de imagens por falta de fotos próprias ou fotos boa resolução, muitas vezes é desafiador encontrar opções inclusivas, mas atualmente já existem bancos especializados, é o caso do Nappy, especializado em pessoas negras, e o Tem que Ter, banco de imagens
Questões sobre diversidade e inclusão vão além e exigem mudanças de curto, médio e longo prazo, mas se a sua organização ainda não pensou sobre isso, precisa começar o quanto antes. Assim como já acontece no setor privado, na temática de ESG, a diversidade das organizações também é um critério decisivo para que grandes doadores definam para onde irão seus recursos.
O site da sua organização atende critérios de acessibilidade? Saiba como oferecer páginas livres de barreiras.