A sustentabilidade econômica das entidades do Terceiro Setor está substancialmente atrelada às doações a elas destinadas. Contudo, regras atuais referentes à tributação de tais doações podem representar um entrave ao fortalecimento da cultura de doação em nosso País.
No Brasil, sobre as doações de bens ou direitos – inclusive na forma de dinheiro – incide o ITCMD – Imposto Sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos1. O imposto é devido ao Estado em que tem domicílio o doador2, porém, em grande parte dos Estados, o donatário é quem figura como contribuinte do imposto. Nos termos da Constituição Federal3, o Senado Federal tem a competência de fixar a alíquota máxima do ITCMD, que atualmente é de 8%4, cabendo a cada Estado fixar suas próprias alíquotas dentro desse limite. Entretanto, o que se observa é uma completa assimetria, não somente no que tange à definição das alíquotas, bases de cálculo e contribuintes, mas também no que tange aos procedimentos de reconhecimento de isenções e imunidades.
Um breve paralelo entre as normas vigentes nos Estados de São Paulo e no Rio de Janeiro pode ajudar a ilustrar essa questão. No Estado de São Paulo, são isentas do imposto a transmissão por doação cujo valor não ultrapasse 2.500 UFESPs5 por ano, entre o mesmo doador e donatário, o que equivale, para o exercício de 2017, a R$ 62.675,006. Também são isentas as doações a entidades cujos objetivos sociais sejam vinculados à promoção dos direitos humanos, da cultura ou à preservação do meio ambiente7. Para o reconhecimento de isenção, a entidade deverá apresentar pedido ao Delegado Regional Tributário8, juntando a documentação pertinente9, sendo que o deferimento do pedido possui validade de 1 ano10. Procedimento semelhante se aplica às entidades de educação e assistência social imunes nos termos da Constituição Federal11, as quais também estão condicionadas a processo de reconhecimento, mediante emissão da “Declaração de Reconhecimento de Imunidade ao ITCMD”, com validade de 4 anos12.
Já no Estado do Rio de Janeiro, são isentas as doações, em dinheiro, de valor que não ultrapasse a quantia equivalente a 11.250 UFIRs-RJ por ano, por donatário13, o que equivale, em 2017, a R$ 35.988,8714. Não há, entretanto, previsão de isenção específica para entidades sem fins lucrativos, independentemente da natureza das atividades exercidas. Há somente previsão para o reconhecimento da imunidade, que se dá por meio de processo administrativo a ser instaurado por iniciativa da entidade donatária, para cada doação recebida15.
Vê-se, assim, que nesses dois Estados as regras e os procedimentos diferenciam-se de forma considerável. A situação se torna mais complexa na comparação das normas de outros Estados, muitos dos quais sequer preveem isenções voltadas às entidades sem fins lucrativos.
De modo a simplificar e favorecer a realização de doações para entidades do Terceiro Setor, é importante criar uma maior uniformidade nas regras de cada Estado. A existência de regras extremamente discrepantes e, por vezes, confusas ou omissas, desmotiva a realização de doações, vez que geram inseguranças aos doadores e às entidades donatárias.
Nesse mesmo sentido, também são medidas importantes a redução das burocracias, incluindo os documentos exigidos para o reconhecimento da imunidade ou isenção, bem como a ampliação dos prazos de concessão dos benefícios.
Por fim, a previsão de isenções tributárias específicas para entidades do Terceiro Setor (como, por exemplo, a criação de isenção para doações para fundos patrimoniais em benefício de entidades sem fins lucrativos) e o fortalecimento, como um todo, da legislação que rege as doações, distinguindo efetivamente as doações de interesse público das doações de interesse privado, também se afiguram muito relevantes para estimular o investimento social privado e ampliar a cultura de doação no País.