Basta uma busca na internet para encontrar diversas agências especializadas em influenciadores digitais no Brasil. Isso não ocorre por acaso. Um estudo conduzido pela empresa global de informação Nielsen Media Research mapeou mais de 500 mil influenciadores nacionais que possuem mais de 10 mil seguidores. O número ultrapassa o total de engenheiros civis (455 mil), dentistas (374 mil), arquitetos (212 mil) e se assemelha ao contingente de médicos (502 mil) no país.
Cada vez mais populares em um mundo altamente conectado, os influenciadores digitais são pessoas que produzem conteúdo e possuem um público fiel e engajado nas plataformas online. Como o próprio nome diz, eles exercem certa influência sobre o comportamento e a tomada de decisão de seus seguidores e, constantemente, fecham contratos de publicidade com marcas interessadas em conquistar mais clientes e aumentar o número de vendas.
Essas pessoas podem ser celebridades conhecidas fora da internet ou não e variam desde nano influenciadores (menos de 10 mil seguidores) até mega influenciadores (mais de 1 milhão de seguidores). Ao menos 76% dos internautas brasileiros já consumiram produtos ou serviços após receberem suas indicações e 50% dos seguidores costumam pesquisar a opinião dos influenciadores antes de adquirirem produtos e serviços, apontou uma pesquisa do Instituto Qualibest de Pesquisas de Mercado em parceria com a Spark Marketing, especializada em desenvolver projetos para marcas com influenciadores digitais.
Porém, a parceria entre influenciadores e organizações do terceiro setor ainda é incipiente no país. É o que aponta Juliana Ayrosa, CEO da Fundação Amor Horizontal, que desenvolve parcerias, campanhas e projetos para impactar crianças e adolescentes. Fundada pela influenciadora digital Carol Celico em 2014, a Fundação Amor Horizontal nasceu com embaixadores como os apresentadores de televisão Serginho Groisman e Sabrina Sato, o que foi essencial para atrair visibilidade.
De acordo com Juliana, as parcerias entre organizações da sociedade civil e influenciadores aumentaram há cerca de dois anos, mas estão muito longe do patamar atingido pelo setor empresarial: “Está muito no início. A pandemia trouxe uma bandeira muito importante com as pautas sociais e sobre sustentabilidade. Acho que houve um momento com envolvimento de muitos influenciadores que nunca tinham feito isso, mas foi muito pontual. Cabe às próprias ONGS, e até mesmo às equipes que produzem conteúdo para elas, criar e oferecer essa pauta. Não existe uma agenda como existe com o incentivo ao consumo. Esses trabalhos ocorrem mais quando há desastres ou datas comemorativas, como no Dia das Crianças e no Natal. O posicionamento social e ambiental é um movimento muito positivo e acredito que não deve diminuir”.
Juliana acredita que existe muito potencial inexplorado nessa aliança, que pode ser vantajosa para ambos os lados, mas alguns cuidados são necessários para que isso ocorra. Em primeiro lugar, é preciso ter em mente que nem sempre o trabalho com influenciadores vale a pena. “Existe um desafio muito grande de conseguir influenciadores realmente engajados porque todos têm muita vontade, mas existe a questão da agenda, de cumprir outros compromissos. Sentimos que, muitas vezes, eles não cumprem o que a gente esperava. Por outro lado, quando isso funciona, é ótimo. Em alguns casos, o influenciador supera nossas expectativas e consegue mais resultados do que antecipamos. Não acho que podemos parar de utilizá-los, mas temos que fazer uma seleção”, diz.
Um dos trabalhos feitos pela Fundação Amor Horizontal com influenciadores foi uma campanha realizada no Dia de Doar de 2015. A iniciativa, que contou com a participação de muitos influenciadores (incluindo celebridades), tinha o objetivo de captar doações e propunha que as pessoas desenhassem um coração na palma da mão. Além do desenho, as pessoas postavam as hashtags: #FundaçãoAmorHorizontal e #DoarFazBemAoCoração
Para que os influenciadores consigam aumentar a conscientização dos seguidores sobre a causa, conseguindo apoios e doações, ela recomenda que as organizações pesquisem muito e busquem não apenas suas redes sociais, como também analisem seu perfil, conteúdo, engajamento em causas sociais e trabalhos realizados: “O principal é saber o histórico do influenciador para compreender o contexto em que ele está inserido. É bom promover encontros com ele e convidá-lo para visitar a organização ao invés de apenas trocar dois e-mails. É importante entender também o momento que ele está vivendo”. É importante ter em mente os objetivos da parceria para encontrar influenciadores alinhados aos valores da organização, o que implica pensar também em especialistas no assunto e pessoas fora do círculo midiático.
O contato deve ser feito com bastante antecedência, especialmente em casos em que as pessoas são muito requisitadas e possuem uma agenda concorrida. Outro aspecto relevante é que influenciadores com muitos seguidores não são sinônimo de sucesso e o resultado pode ser melhor com aqueles que têm um público menor, mas são mais engajados. Quanto mais genuíno for o envolvimento do influenciador, maior será sua credibilidade ao divulgar a causa.
“Já acessamos grandes influenciadores que nunca falaram de pautas sociais e o engajamento é muito pequeno. Quando você tem um influenciador que já falou sobre esses temas, os seguidores estão mais habituados, é diferente de quem trabalha apenas com a venda de produtos ou serviços, algo restrito ao aumento do consumo”, esclarece Juliana.
Outra etapa crucial é passar um briefing detalhado, ou seja, todas as informações necessárias para o trabalho realizado pelo influenciador. “É preciso fornecer os dados muito bem à pessoa porque existem terminologias no terceiro setor que precisam ser seguidas e, na linguagem do dia a dia, as pessoas desconhecem ou não usam. O objetivo é que a pessoa fale com a maior propriedade possível, por isso o briefing deve ser reforçado várias vezes”, acrescenta. Preferencialmente, a organização deve colocar suas expectativas, os papéis e responsabilidades do influenciador, informações para que a mensagem seja transmitida de maneira clara, como dados específicos sobre a instituição, a causa, e cronograma.
A CEO da Fundação Amor Horizontal conta que as parcerias estabelecidas entre a instituição e os influenciadores não contêm remuneração, especialmente devido à natureza do trabalho, que ocorre em prol do setor social. Segundo ela, existe a prática de cobrir custos operacionais, como despesas com hospedagem e deslocamento. Mesmo que esses trabalhos sejam feitos pro bono, há uma relação de troca com os influenciadores, que podem aumentar a confiança do público em seu trabalho e ficar ainda mais em evidência ao defender algumas bandeiras. Como a parceria é vantajosa para ambos os lados, é recomendado também que as organizações dêem um retorno sobre seus resultados.
Texto publicado pela Captamos, editoria da ABCR de conteúdos aprofundados sobre mobilização de recursos para causas.