Com o processo de profissionalização experimentado pelo terceiro setor brasileiro nos últimos anos, a atividade de captação de recursos se tornou ainda mais estratégica para a sustentabilidade das organizações da sociedade civil. Mas como selecionar e preparar um bom profissional se não há curso superior de formação para esse tipo de carreira?
Carla Nóbrega, diretora de mobilização de recursos e comunicação da Habitat para a Humanidade Brasil, compartilhou dicas sobre o tema — a organização, que tem como causa a promoção da moradia como um direito humano fundamental, está entre as 100 melhores ONGs do país em 2017, segundo guia organizado pelo Instituto Doar e pela revista ÉPOCA.
As orientações listadas por Carla são resultado de sua vivência na área: em novembro de 2016, a Habitat começou a montar uma equipe, hoje com 20 pessoas, para captar recursos na rua, o que envolve seleção, treinamento e motivação. Já no escritório, ela comanda outras seis, que atuam em áreas como captação com indivíduos, empresas e grandes doadores. Confira as dicas da especialista.
Saiba o que buscar
A primeira dica da Carla é: defina o perfil que sua instituição procura. Ela diz, por exemplo, que trabalhos com base de doadores individuais e de baixo ticket médio demandam profissionais que entendam de ferramentas de marketing massivo. Já grandes doadores pedem captadores que apresentem habilidade no trato pessoal.
Diante da inexistência de graduação em captação de recursos, em geral, os profissionais vêm de áreas como administração, relações públicas, marketing e comunicação, afirma.
Como selecionar?
“Com base no que pedimos, temos um sistema interno de pontuação que nos indica um salário a oferecer. A vaga é então publicada no site do Gife [Grupo de Institutos Fundações e Empresas], na nossa página no Facebook e em um grupo [na mesma rede social] chamado Empregos no Terceiro Setor. Quando buscamos estagiários, o cargo é também divulgado em faculdades”, diz.
Uma forma de fazer uma pré-seleção de currículos é pedir que os interessados enviem pretensão salarial e uma carta de apresentação. “O texto nos ajuda a cortar de cara quem não tem o perfil que buscamos. Mesmo depois da entrevista, podemos ainda pedir uma redação e checar referências”, afirma.
Na hipótese de haver muitos candidatos, a saída pode ser fazer uma dinâmica para selecionar os mais qualificados.
Contrato e premiações
Ok, você já decidiu qual é o captador de recursos mais adequado para sua instituição. Agora, é o momento de contratá-lo. A Habitat, por exemplo, figura entre as organizações que optam por adotar contrato no regime CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) — no setor, é comum ainda os que atuam como pessoa jurídica. No caso dos captadores de rua, no entanto, a ONG também aplica um sistema de prêmios como forma de manter a equipe motivada.
“Dividimos os profissionais em três grupos, com um líder cada um, e costumamos oferecer premiações por desempenho. Os membros tendem a ser jovens e acabam também tendo mais contato com gente desse perfil. Premiamos a aquisição de pessoas mais velhas, por exemplo, que tendem a ser doadores mais recorrentes”, explica Carla, que acrescenta: “Oferecemos de idas à pizzaria até visitas às comunidades que são atendidas com os recursos que eles captaram. Esse último tipo de prêmio tem muita aceitação na equipe, pois dá concretude ao trabalho. Os profissionais se sentem mais pertencentes à organização.”
Capacitar é preciso
Uma organização que pretende contar com um bom e atualizado time de captadores deve investir na capacitação desses profissionais. No caso da Habitat, é oferecido um treinamento de três dias voltado principalmente para os que atuam na rua. “Ele é ministrado por nós e também por uma consultora contratada. São tratados vários assuntos: nossa missão, como trabalhamos e como funciona nosso sistema de CRM (Customer Relationship Management), entre outros. Mas talvez o mais importante seja sobre técnicas para que os profissionais deem feedbacks do trabalho com o público”, avalia.
E não são apenas os novos captadores que recebem qualificação. Os mais antigos também passam constantemente por reciclagens. Mais do que o aperfeiçoamento, esses momentos funcionam também para tornar a equipe ainda mais engajada e coesa.