Em 2015, a Benfeitoria, plataforma online de mobilização de recursos para projetos de impacto cultural, social, econômico e ambiental, lançou o primeiro projeto de matchfunding, modelo de financiamento coletivo, do setor público no Brasil. Desde então, o modelo tem se popularizado cada vez mais e representa um grande aliado para organizações da sociedade civil.
O termo matchfunding foi criado a partir da junção de duas palavras em inglês: match (combinação) e funding (financiamento) e se refere a uma forma de financiamento coletivo e misto, que envolve a participação de uma empresa, instituição ou até mesmo o poder público e uma comunidade de apoiadores. Conhecido como financiamento coletivo turbinado, o modelo possui um funcionamento simples: a cada real que uma pessoa doa para um projeto, um segundo doador duplica ou triplica o valor.
O primeiro matchfunding da Benfeitoria foi criado em parceria com a Natura e chamava-se Natura Cidades. Seu objetivo era oferecer um aporte financeiro para projetos voltados à intervenção urbana no Rio de Janeiro, ressignificando os espaços públicos e tornando-os mais acolhedores. Um estudo conduzido pela organização norte-americana Double the Donation, que cria soluções para campanhas de matchfunding, constatou que 84% das pessoas estão mais propensas a doar quando o valor é dobrado por uma empresa e que uma em cada três pessoas doaria mais nessa situação. A Benfeitoria corroborou essa tendência ao perceber que 76% dos apoiadores de projetos de matchfunding foram influenciados a doar porque existia uma multiplicação da quantia arrecadada.
Matchfunding transmite segurança para doadores e é positivo para todos os atores envolvidos
O modelo é positivo para todos os agentes envolvidos no processo. Os projetos beneficiados conseguem melhores resultados na captação de recursos, os colaboradores sentem mais segurança no momento de realizar doações e os patrocinadores utilizam a inteligência coletiva para apoiar iniciativas de impacto social.
“Uma das vantagens do matchfunding é a agilidade. Conforme as metas são atingidas, as organizações recebem um repasse direto, diminuindo o desgaste na busca por recursos. A jornada de captação é muito dolorosa para organizações sociais que não têm uma grande rede. Se você não tem uma rede tão potente, o matchfunding se torna mais desafiador, ao contrário de quando você tem uma rede robusta. Ele mobiliza os recursos existentes do campo filantrópico e direciona isso de maneira ágil. As pessoas também sentem uma segurança em relação às iniciativas que passam a ganhar visibilidade e não estão sozinhas. Os projetos são apresentados para todo o país e são legitimados por um fundo. Até o diálogo fica mais fácil, pois gera credibilidade para o apoiado e uma segurança maior para quem doa porque a pessoa sabe que tem alguém junto com ela”, afirma Wagner da Silva, coordenador de Fomento a Agentes e Causas da Fundação Tide Setubal.
A Tide Setubal criou o Matchfunding Enfrente em 2019 e já realizou cinco edições dele. Segundo Wagner, a ideia surgiu quando a fundação estava repensando sua forma de atuação. “A fundação vinha de uma atuação local na periferia de São Paulo durante dez anos e começou a se conectar com outras iniciativas e ações pela cidade. Havia um campo de oportunidades para lançar uma chamada para levar sua missão para mais longe. Nós nos aproximamos da Benfeitoria e conhecemos a proposta de matchfunding para tentar ter um espaço de seleção de boas práticas pelo Brasil e impulsionar investimentos, criando uma plataforma que pudesse ser uma espécie de vitrine e visibilidade para iniciativas potentes da periferia”.
As cinco edições do Enfrente já arrecadaram mais de R$10 milhões que foram distribuídos por todo o Brasil. Em 2020, o Enfrente apresentou a modalidade Onda Estruturante, que esteve no ar até janeiro de 2021, e visava fortalecer agentes locais das periferias brasileiras em busca de soluções para enfrentar problemas socioeconômicos e urbanos em longo prazo. Os resultados foram inéditos e todas as iniciativas alcançaram 100% das metas de captação. O valor total da arrecadação foi de R$ 1.432.497. Em três anos de captação, o Enfrente auxiliou mais de mil projetos em todo o Brasil e com diferentes formas de atuação.
Compreensão do termômetro socioeconômico do país
Wagner elenca algumas características importantes para instituições que desejam utilizar o matchfunding como instrumento de captação. “As organizações beneficiadas precisam ter uma iniciativa potente, legitimidade no território, uma boa trajetória, apresentar respostas aos problemas, estarem conectadas e ter uma boa rede. Uma organização com uma rede ampla de parceiros e uma diversidade de atores dentro dela potencializa as chances de sucesso. Uma organização que tem 300 ou 400 pessoas dentro da rede terá mais dificuldades do que uma com mais de 5 mil pessoas”, explica.
No entanto, Wagner ressalta que a prática deve ser entendida como uma possibilidade a mais dentro da captação, que deve utilizar várias estratégias para não ficar refém de apenas uma maneira. De acordo com ele, 70% das organizações que participaram do Enfrente desconheciam o que era matchfunding e mais de 80% delas conseguiram bater suas metas de captação. Mesmo que a prática esteja em ascensão, Wagner frisa que é importante saber analisar o contexto de sua aplicação. “É preciso entender o termômetro socioeconômico do país. A sociedade brasileira tende a doar mais em situações emergenciais, como a fome. Nesse momento, as organizações que têm olhado para isso e para o combate à pobreza costumam ter mais êxito”, finaliza.
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Texto publicado pela Captamos, editoria da ABCR de conteúdos aprofundados sobre mobilização de recursos para causas.