Ninguém contrata sem saber quanto quer pagar de salário. Em empresas mais estruturadas, há planos de cargos, carreiras e salários (PCCS), o que proporciona inclusive o crescimento profissional. Em empresas menores, o plano pode não existir, mas definitivamente o contratante sabe quanto quer – e muitas vezes quanto pode – remunerar para o cargo que deseja preencher.
O mesmo vale para as organizações da sociedade civil. Nenhuma vaga é aberta sem que o valor da remuneração já não esteja definido. Fazer de forma diferente seria arriscado, e até uma má prática de recursos humanos.
Porém, assim como nas empresas, é cada vez mais comum vermos vagas sendo divulgadas nas ONGs com o singelo pedido de “enviar pretensão salarial”.
Oras, se a organização já sabe quanto é o salário, porque ela não é transparente e o divulga? Por que ela pede que os interessados na vaga enviem uma aproximação do salário definido?
Nas empresas, a razão para isso é muito clara: contratar melhores profissionais pagando menos. Já nas organizações, ainda estamos tentando entender.
Quando não se divulga o salário, e os candidatos é que têm que enviar quanto querem ganhar, e o contratante tem a possibilidade de negociar salários menores com os interessados à vaga. Isso acontece com frequência em períodos de crise econômica. Estes, vulneráveis que estão, tendem a aceitar o salário baixo oferecido, criando uma situação ruim para o profissional.
Muitas vezes, um dos argumentos das empresas é que, assim, podem eventualmente receber currículos de profissionais melhores qualificados, mesmo que eventualmente peçam um salário maior. Mas se a organização tem um perfil de profissional desejado, tem uma vaga já definida, e sabe quem quer e quanto quer pagar, por que ela trocaria tudo isso no ar em razão de uma única pessoa? Por que já não divulgaria uma vaga com um perfil mais qualificado de profissional? De novo, péssimo exemplo de gestão de recursos humanos.
No terceiro setor, trabalhamos com causas. No terceiro setor, trabalhamos com o recurso dos doadores. Não podemos errar. Não podemos repetir as práticas do segundo setor.
Ser transparente na nossa política de recursos humanos e respeitar o trabalhador é uma condição obrigatória para que tenhamos legitimidade e verdade no nosso trabalho, no impacto que queremos trazer para a sociedade.
Por isso, divulgar o valor do salário para a vaga que a ONG deseja preencher é um detalhe pequeno, mas fundamental. E os motivos para fazê-lo são vários.
Primeiro, permite que os interessados só enviem currículos se realmente o salário estiver dentro do que eles esperam receber. Possibilita o foco e evita perda de tempo do trabalhador.
Segundo, evita o desperdício dos recursos da própria organização. Ao não divulgar o valor do salário, ela precisa analisar mais currículos, falar com mais candidatos, encontrar aqueles que, além do perfil adequado, também aceitem o valor que querem remunerar. É um trabalho a mais que precisam fazer (portanto, é despesa para elas) e, se já tivessem divulgado o salário, esse aceite ao valor já estaria dado no envio do currículo.
Terceiro, proporciona transparência para com a comunidade. Somos financiados pelos doadores, pelas pessoas, empresas e organizações que acreditam na nossa causa. É fundamental que eles saibam que estamos usando da melhor forma possível os seus recursos, pagando um salário justo e adequado para todos os nossos funcionários, sem repetir práticas de desrespeito ao trabalhador que muitas vezes vemos no segundo setor. E doação, como sabemos, é confiança.
Tudo isso vale para a captação de recursos. Divulgamos muitas vagas na ABCR, e a grande maioria delas vem sem o salário que a organização tem para aquela vaga. Temos alguns bons exemplos, como a Oxfam e o Teto, mas ainda temos muito o que avançar.
Por isso, fica o pedido e a dica também: vai contratar um captador? Divulgue o salário, e receba os currículos de quem está realmente interessado na vaga e no salário oferecido. Todo mundo ganha com isso.João Paulo Vergueiro, administrador, diretor executivo da ABCR – Associação Brasileira de Captadores de Recursos e professor de responsabilidade social corporativa da FECAP.