Seminário realizado em Brasília no dia 29 de abril, por iniciativa do senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), da Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA), discutiu projeto de lei federal apresentado pelo senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), que tem como relator o próprio senador Rollemberg (PSB-DF) e propõe-se a garantir a estabelecer um marco regulatório que garanta a transparência, clareza e segurança jurídica das Organizações de Sociedade Civil e seus projetos. A ABCR acompanhou o Seminário.
Abriram o seminário o próprio Senador Rodrigo Rollemberg, o Ministro Gilberto Carvalho, o Senador Blairo Maggi, que preside a CMA, Edison Almeida, do TCU e Carlos Higino, da CGU, além de Vera Masagão, da ABONG, que representava ali todas as organizações da sociedade civil. Todos ressaltaram a importância de ouvir a sociedade civil e os setores públicos envolvidos.
O representante do TCU mostrou preocupação com a capacidade desse órgão de monitorar as prestações de contas das organizações, concordando com o CGU de que há muito “joio no meio do trigo” e que uma melhor seleção das parcerias facilitaria esse processo, uma vez que as ONGs selecionadas já cumpririam premissas básicas.
O Ministro Gilberto Carvalho esteve lá para reforçar o apoio da Presidência da República a este movimento, dizendo que tanto Lula antes, quanto Dilma agora, declararam que iriam fazer a coisa andar, revendo a legislação das ONGs e aumentando os repasses do Governo. Vera Masagão, da ABONG, criticou as declarações da presidenta Dilma, que prometeu no início do seu mandato que a questão já estaria resolvida em menos de um ano.
Laís Lopes, da Secretaria da Presidência, falou sobre as discussões e conclusões a que chegaram no Grupo de Trabalho que foi formado para discutir esse marco legal. Ficou claro que há uma insegurança jurídica por parte das ONGs, uma vez que não há legislação específica, mas muitos entraves a parceria diretas com o Estado. O grupo chegou a três principais premissas para o marco legal:
• Norma específica para regular as parcerias das Organizações de Sociedade Civil
• Transparência no controle e execução dos projetos e parcerias
• Eficiência dos projetos e parcerias
A sugestão é que a norma específica apresente algo como um “Termo de Fomento e Colaboração”, documento a partir do qual as OSCs fariam parcerias com o Estado para receber recursos diretos. Hoje, só 3% das organizações têm parceria com o governo.
O “Termo de Fomento e Colaboração” teria 5 fases: planejamento, seleção, execução, monitoramento e avaliação, prestação de contas.
Ficou claro que todos concordam que a seleção se dará por chamamento público e que a publicidade das oportunidades de parceria é fundamental e deve ser bem feita. A seleção já tem algumas premissas definidas, como a existência da organização há pelo menos três anos. Sugere-se que seja criado um tipo de “Ficha Limpa” para as organizações e seus dirigentes. Mais uma vez, fala-se em separar as boas e honestas, daquelas fantasmas ou desvirtuosas.
Além da documentação básica hoje exigida, sugere-se que seja entregue no processo de seleção relatório anual das atividades da organização, comprovando sua experiência na área objeto de sua proposta de parceria.
Discutiu-se muito a exigência de contrapartidas financeiras ou em bens ou serviços que se prevê exigir das organizações. A ABONG colocou bem que isso poderia excluir as OSCs que não dispõem de recursos financeiros algum, e ainda que não seria ético exigir dinheiro de uma associação que se proponha a cumprir um papel social do próprio Estado, como muitas vezes acontece. Ficou evidente que a avaliação de contrapartidas no processo seletivo fere o principio da isonomia, facilitando a entrada das OSCs que dispõem de mais recursos. Vera Masagão sugeriu que as contrapartidas não sejam aquelas que se pode medir monetariamente, mas sim ações, resultados, impactos sociais.
Marcelo, da AGU, reforçou que o projeto do senador Aloysio Nunes obriga as entidades interessadas em parceria com o poder público a observar princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e eficiência. Os estatutos dessas organizações devem coibir a obtenção de vantagens indevidas por seus dirigentes e prever a divulgação anual de relatório de suas atividades e de suas demonstrações financeiras.
Ele também chamou a atenção para a importância de uma seleção bem feita dos projetos, pois os órgãos de fiscalização hoje têm dificuldades no monitoramento e prestação de contas das organizações que não seguiram determinadas premissas, ou são inexperientes, e isso contamina todo o processo. Segundo ele, uma seleção mal feita e mal publicitada acarreta em:
• Entrega do projeto a organizações que não sejam adequadas para executá-lo.
• Custo de oportunidade para o Estado, pois os recursos públicos são mal empregados e o resultado não é atingido.
• E uma suspeição generalizada sobre as OSCs pelos órgãos de controle interno e externo, uma vez que a falta de publicidade e a seleção de organizações inadequadas gera suspeitas de favorecimento, e os funcionários dos órgãos, diante dessas suspeitas, acabam por “dificultar a vida” dessas organizações.
Outro ponto importante que foi discutido é que não se deve exigir que as OSCs precisem usar de processos de licitação para o uso dos recursos. É evidente que a seleção de fornecedores e prestadores deve ser criteriosa, transparente e regulada, mas não licitatória. Todos concordam com isso (AGU, CGU, PR, ABONG), embora haja diferença de opiniões quanto ao regulamento, mais ou menos burocrático e criterioso.
Foi questionada a capacidade operacional dos órgãos públicos responsáveis pelas parcerias e sua capacitação e a AGU assumiu essa responsabilidade.
Vera Masagão sugeriu a criação de uma comissão que fomente, regule e controle a relação do Executivo com as OSCs, e que seja capaz de propor inclusive mudanças na legislação. A comissão deveria ser ligada ao Executivo, mas não pertencer a ele.
Quanto à prestação de contas, falou-se sobre todas as normas e procedimentos dos quais não se pode abrir mão. Explicou-se o funcionamento do SICONV e suas melhores características. Um dado que foi destacado é que apenas 8% dos repasses da União por meio de convênios, contratos de repasse e termos de parceria são feitos através do Sistema.
Silvio Sant’anna, que representava o Comitê Facilitador da Plataforma para este marco que discutimos, sugeriu que as OSCs pudessem prestar contas através de sua contabilidade. Um processo que facilitaria e reduziria a burocracia e retrabalho causados por uma prestação de contas em diferentes modelos, nas diferentes formas de receber recursos do Estado.
Pontos altos e algumas impressões:
• Ao longo do dia foi sugerido mais de uma vez que se arquivasse os processos de prestação de contas de organizações que já estão há mais de cinco anos parados ou em aprovação. Ao final, uma palavra do representante da CGU deixou o assunto claro: a CGU, o Senado e a PR apoiam que haja um arquivamento desses casos, desde que restrito a projetos de até 100 mil reais e onde não haja suspeitas de fraude. O caminho para isso foi definido: a reedição de uma Portaria do Arquivamento que já existe para outros casos.
• A reclamação da burocracia tomou mais o lugar na segunda parte do evento, que tratava do “Monitoramento e Prestação de Contas”. Além das queixas comuns, surgiu a sugestão de que seja possível fazer as parcerias plurianuais, evitando assim a dificuldade que hoje muito se enfrenta com os convênios de prestação de contas anual vinculada a nova liberação de recursos. Com o atraso dos novos recursos, há descontinuidade nas atividades das organizações.
• Os dois representantes do Terceiro Setor, Vera Masagão da ABONG e Silvio Sant’Anna da Plataforma Facilitadora, além de indivíduos da plateia por meio de perguntas e provocações, trouxeram algumas vezes o questionamento sobre o tratamento que as OSC’s recebem do governo. As organizações são tratadas com desconfiança na maioria das vezes, as leis são feitas considerando um setor em que não se pode confiar. As OSCs são objeto de uma cobrança exagerada na prestação de contas e nas exigências para receber os recursos. Há claramente uma cultura no governo que não reconhece o papel democrático e social dessas organizações. O Estado precisa reconhecer que somos atores de ações de interesse público, e nos ver como parceiros. Embora todo o discurso dos representantes do Governo Federal fosse de apoio às causas do Terceiro Setor, ficou claro que os mais experientes não estão satisfeitos com a forma como as promessas não vem sendo cumpridas com o setor.
• A capacitação das organizações e dos órgãos públicos foi citada algumas vezes, no entanto, parece que o Governo ainda não percebe que capacitar o terceiro setor vai além de ensinar administração pública e como cadastrar seu projeto no SICONV. Não foi demonstrado interesse do Governo em promover uma capacitação de gestão às organizações.
O PLS 649/2011 está sendo trabalhado há dois anos por um grupo gerido pelo Senado. Já foi aprovado pela Comissão de Serviço de Infraestrutura (CI) do Senado e ainda será analisado, após a análise e votação da CMA, pelas comissões de Assuntos Econômicos (CAE) e de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Texto de Suellen Moreira, associada e Coordenadora do Grupo Temático de Cultura da ABCR.