Na última semana de abril, o Ministro da Fazenda Fernando Haddad entregou ao Congresso Nacional um projeto de lei complementar que detalha a regulamentação da reforma tributária, incluindo a definição de uma alíquota média de 26,5% para o Imposto sobre Valor Adicionado (IVA). A proposta substitui múltiplos tributos anteriores e visa modernizar e digitalizar o sistema tributário brasileiro. Ainda há um longo percurso até a definitiva regulamentação e no Terceiro Setor a expectativa é pelo fim do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), que entrou para o texto da reforma no final de 2023.
Enquanto acompanha os próximos passos, a ABCR entrevistou a senadora Mara Gabrilli (PSD-SP), que apresentou, em abril de 2020, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 20/2020, com o objetivo de alterar o Art. 155 da Constituição Federal para vedar a instituição do ITCMD sobre as transmissões e doações às organizações da sociedade civil e aos institutos de pesquisa sem fins lucrativos, e uma fundamental parceira da ABCR no avanço da pauta nos últimos quatro anos.
Incentivo à filantropia
A senadora destaca a importância de cultivar a solidariedade, sublinhando que a isenção do ITCMD para doações a organizações da sociedade civil é um passo fundamental nessa direção. Ela ressalta: “Ao entender que as doações direcionadas para entidades filantrópicas cumprem um papel crucial na garantia dos direitos sociais, especialmente onde o Estado não alcança ou atua de maneira ineficiente, confirmamos que tais contribuições não devem ser oneradas com tributos. Elas são, ao contrário, investimentos na equidade e no bem-estar coletivo, e como tal, devem ser estimuladas”.
Reconhecer e valorizar as organizações, segundo a senadora, passa pela necessidade de criar um ambiente que facilite o crescimento e a sustentabilidade delas, sendo “imperativo fortalecer a cultura da filantropia no Brasil”. “As organizações da sociedade civil (OSC) muitas vezes suplementam as lacunas deixadas pelo Estado, atendendo às demandas sociais não cobertas, especialmente aquelas que afetam a população de baixa renda. A cobrança de impostos sobre as doações que recebem implica em menos recursos disponíveis e limita sua capacidade de atuação”.
Acompanhamento da sociedade civil no processo de regulamentação

Agora que o foco da Reforma Tributária – e com ela o fim da incidência do ITCMD – está no processo de regulamentação, Mara Gabrilli chama atenção para o acompanhamento contínuo.
“A inclusão da isenção do ITCMD para organizações da sociedade civil na Reforma Tributária foi sem dúvida de grande importância. Contudo, é fundamental que continuemos vigilantes durante o processo de regulamentação para assegurar a criação de normas que sejam simples e eficazes. Nossa atenção deve ser focada em evitar um excesso de burocracia, requisitos e exigências. Vamos assegurar que as novas diretrizes sejam implantadas de modo a trazer benefícios reais para o terceiro setor”.
Ela também ressalta a importância da participação da sociedade civil nas discussões legislativas. “O envolvimento ativo da sociedade civil é fundamental para o trabalho legislativo, e priorizo manter um diálogo aberto e receptivo às suas demandas. A colaboração com a ABCR tem sido muito gratificante, com debates e contribuições valiosas que refinam as propostas legislativas e fortalecem o apoio ao terceiro setor”.
Colocar o Terceiro Setor no centro das discussões
Questionada sobre como enxerga o cenário das doações filantrópicas no Brasil. A senadora é otimista, mas reconhece que ainda há desafios, especialmente em termos de segurança jurídica para doadores e donatários. Ela mencionou a necessidade de trabalhar com o Banco Central para corrigir distorções que tarifam doações como se fossem operações comerciais.
“Infelizmente, há uma confusão entre pagamento e movimentação financeira que implica inadequação da legislação brasileira, especialmente para realização de movimentações financeiras de natureza diversa de pagamentos, como ocorre na doação, que acaba por ser tarifada pelos bancos como se fosse uma operação comercial. Tenho outros projetos que visam corrigir essas distorções para os quais estamos buscando o apoio do Banco Central e buscando caminhos para que sejam consideradas de outra maneira”.
Gabrilli diz que ainda é preciso disseminar mais conhecimento entre o parlamento e os governos sobre o papel e a importância do terceiro setor e que a imunidade concedida às instituições gera benefícios para toda a sociedade. “O nosso desafio é tirar o terceiro setor da margem e colocar no centro das discussões. Sem ouvir essas organizações, que muitas vezes chegam aonde o Poder Público não atua, não conseguiremos alcançar o ideal que buscamos: um Congresso aberto para as demandas da sociedade. E quem melhor que o terceiro setor para apontar isso? Costumo dizer que legislar é um exercício de ouvir. E o momento requer isso”, conclui.