Acumular pontos que podem ser trocados por milhas, produtos ou experiências é uma estratégia de conquista de clientes bastante adotada por empresas. A popularidade dos programas de fidelidade tem aumentado cada vez mais no Brasil. De acordo com dados da Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Fidelização (ABEMF), o percentual de pessoas interessadas em receber benefícios em compras alcançou 72% em 2022. Em 2019, esse patamar era de 65%. Empresas de todos os portes oferecem vantagens em compras, desde companhias aéreas e de cartões de crédito a pequenas varejistas.
A prática cria uma proximidade com a empresa e é utilizada para fidelizar clientes, atrair novos consumidores e aumentar as vendas. Há várias maneiras de estruturar programas de fidelidade: criar ofertas e recompensas exclusivas, elaborar um sistema para acúmulo de pontos que serão trocados por produtos ou experiências são apenas alguns dos benefícios proporcionados por essas iniciativas. Embora seja uma estratégia muito conhecida no setor corporativo, ela pode ser utilizada por organizações da sociedade civil que desejam alavancar a captação de recursos.
Foi exatamente isso que Christofer Müller, diretor de captação de recursos da Aldeias Infantis SOS – organização global que atua no cuidado e proteção de crianças, adolescentes, jovens e suas famílias – pensou quando estruturou o Melhor Amigo SOS, programa de fidelidade pioneiro no Terceiro Setor em 2018.
“Minha experiência profissional é do setor corporativo, eu vim do segundo setor, trabalhei em banco, em telefonia e era usuário de programas de fidelidade de milhas e de tudo o que eu pudesse trocar por pontos e ganhar algo. Quando migrei para o Terceiro Setor, pensei que era uma possibilidade de melhorar a experiência do doador e trazer um nível de relacionamento diferente”, relata.
Durante suas pesquisas sobre o assunto, Christofer não encontrou nada semelhante no Brasil e tampouco a nível internacional. No entanto, ele acreditava que a prática poderia ser inovadora para a organização e decidiu fazer um teste. Em 2018, nasceu o primeiro piloto do programa de fidelidade Melhor Amigo SOS. Na época, a cada R$ 1,00 doado para a Aldeias Infantis SOS, as pessoas ganhavam um ponto.
Havia diferentes faixas de valor para as doações que permitiam a conquista de dois ou três pontos. Quanto maior a doação, maior o número de pontos. Era possível trocá-los por produtos básicos do dia a dia como agendas, calendários e canecas ou por pontos da LATAM Pass (programa de benefícios da LATAM Airlines).
Atualmente, a parceria da Aldeias Infantis SOS não ocorre diretamente com a LATAM Pass, mas com a Pontos Livve, que permite o acesso a uma grande variedade de produtos como vouchers de desconto em lojas e restaurantes, catálogo exclusivo para usar os pontos nas compras, pontos no LATAM Pass, desconto em produtos de sites de e-commerce e pagamentos de boletos ou recarga de celular.
Para participar do Melhor Amigo SOS, é preciso ser uma pessoa física que contribui mensalmente com a Aldeias Infantis SOS com um valor mínimo de R$ 20,00 via cartão de crédito ou débito e realizar um cadastro no site da organização. O programa tem parcerias com marcas conhecidas como Boticário, C&A, Calvin Klein Brasil, Eudora, Marisa, TokStok. Nestes casos, o doador acumula 50 pontos e troca por um cupom de desconto para adquirir produtos das marcas.
Outro diferencial da operação hoje é o aumento do portfólio de produtos exclusivos com a identidade da organização como blocos de anotações, bonés, jogo da memória e mochila. Há também produtos sociais que são produzidos por projetos realizados pela Aldeias Infantis SOS ou seus parceiros e geram novas oportunidades para os beneficiários. São bolsas, mochilas, nécessaires, panos de prato, chaveiros entre outros.
Em cinco anos de existência, mais de três mil vouchers foram resgatados por meio do Melhor Amigo SOS, que causou um impacto nítido na captação de recursos da instituição. Christofer aponta que os doadores que participam da iniciativa fazem mais doações e contribuem com quantias maiores, além de colaborarem com a instituição por, no mínimo, o dobro do tempo.
“Fazemos perguntas recorrentes sobre a experiência da troca de pontos, os produtos e a comunicação realizada pelo programa e a nota média da experiência é 9,6. As pessoas ficam muito satisfeitas. Historicamente, o programa se provou como um bom caminho para aumentar a fidelização do doador”, afirma.
“Nosso grande desafio é colocar mais gente na base do Melhor Amigo SOS porque é preciso uma ação ativa do doador de entrar lá e se cadastrar, não é automático. Quanto mais doadores estiverem dentro da base, isso vai melhorar os indicadores de qualidade da operação”, completa, acrescentando que o programa conta com 5500 doadores cadastrados.
Maturidade na captação
Apesar do sucesso, Christopher observa que as organizações precisam ter um nível de maturidade adequado na captação de recursos: “Não adianta ter programas de fidelidade sem uma régua de relacionamento que envie e-mails automáticos ou sem conseguir cobrar adequadamente o doador. O programa é um passo avançado dentro de uma estrutura de relacionamento e fidelização de doadores”.
Ele aconselha que, em primeiro lugar, as instituições analisem bem seus indicadores e tracem objetivos claros. Antes de implementar o Melhor Amigo SOS, a Aldeias Infantis SOS percebeu que o ticket médio de doações estava em torno de R$ 35,00. A instituição definiu que uma das metas do programa seria aumentar esse valor, que alcançou R$ 48,00. A partir da definição de objetivos, será possível pensar em estratégias para atingi-los.
Produtos e parcerias
“Se você tem um projeto que já produz materiais de costura ou artesanato, o programa de fidelidade pode ser um canal para escoar sua mercadoria. Mas esses objetivos precisam estar bem claros: conseguir doadores de longo prazo, aumentar doações extras etc”, aponta Christofer.
Em seguida, é interessante procurar parceiros para oferecer benefícios aos doadores cadastrados. As parcerias não precisam ser realizadas com marcas famosas, basta que despertem o interesse de quem ajuda a organização. A Aldeias Infantis SOS só começou a trabalhar com marcas reconhecidas após quatro anos.
Uma alternativa é iniciar com produtos sociais e, conforme o programa amadurece, realizar parcerias mais atrativas. “É preciso pensar na experiência do doador, se ele só quer ter uma caneta ou agenda. Pode ser que ele não troque pontos só por causa disso, é necessário fazer uma boa análise e até fazer uma pesquisa”, avalia Christofer.
Caso a instituição já tenha o hábito de fazer uma pesquisa de satisfação periódica, uma opção é acrescentar perguntas relacionadas ao programa de fidelidade para saber se os doadores se interessam pela iniciativa e descobrir a melhor maneira de estruturá-la. Quando implementada corretamente, a ação faz com que os doadores se sintam mais valorizados e pode ser muito benéfica para os resultados da captação.
E por falar em novas maneiras de atrair doadores, que tal ler nossa matéria sobre presentes solidários?
Texto publicado pela Captamos, editoria da ABCR de conteúdos aprofundados sobre mobilização de recursos para causas