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Campanha de capital: como organizações estruturam grandes arrecadações de longo prazo

As campanhas de capital estão entre as formas mais complexas e ambiciosas de captação de recursos no terceiro setor. Diferentemente de ações pontuais ou recorrentes, essas campanhas são estruturadas para levantar valores muito superiores ao orçamento anual de uma organização e têm como finalidade investimentos de caráter estratégico, como a construção de prédios, aquisição de terrenos, compra de equipamentos ou a formação de fundos patrimoniais.

O tema foi abordado na masterclass do especialista costarriquenho Victor Hugo Naranjo durante o 17º Festival ABCR, realizado em junho. Durante a aula, detalhou fundamentos, etapas e critérios de sucesso desse tipo de mobilização, apontando o impacto que podem gerar e também os riscos de se iniciar o processo sem a devida preparação.

O que caracteriza uma campanha de capital

Segundo Naranjo, campanhas de capital são esforços intensivos para levantar uma quantia específica em um período determinado. São mobilizações excepcionais, que têm como meta arrecadar de quatro a dez vezes o orçamento anual da organização. A lógica é diferente das campanhas regulares: exige anos de preparação e envolve praticamente toda a estrutura institucional. Por isso, exige alto nível de autoconhecimento da organização, para saber se realmente está preparada para uma campanha deste porte. 

As campanhas de capital podem se estender por quatro a doze anos e costumam seguir uma sequência de fases já consolidada em diferentes países. O processo começa com a avaliação e preparação, que pode levar até quatro anos, dedicada a definir claramente para que os fundos serão solicitados e quais recursos estão disponíveis para esse trabalho. Em seguida, ocorre a pesquisa de percepções, ou estudo de viabilidade, que mede como a organização é vista por seus públicos estratégicos e qual a disposição real de doadores em apoiá-la. Essa etapa é considerada essencial para ajustar metas e compreender se há condições concretas para avançar.

A partir daí, começa a fase silenciosa, quando as maiores doações são buscadas de forma discreta e reservada. A captação de recursos é um esporte de contato. Grandes doações não se decidem em campanhas massivas, mas no encontro certo, com as pessoas certas, no ambiente certo”, avaliou Naranjo. Só após alcançar entre 70% e 80% da meta, inicia-se a fase pública, com engajamento do público geral, divulgação em mídia de massa, redes sociais e eventos. A última etapa é a conclusão, dedicada a garantir que as promessas feitas sejam efetivamente cumpridas.

Doadores

Um dos princípios centrais destacados por Naranjo é que a maior parte dos recursos de uma campanha vem de poucas pessoas. Entre 75% e 80% da meta é atingida com um número reduzido de grandes doadores. Segundo ele, em experiências na América do Sul já se observou que 80% do valor necessário foi conquistado com apenas 20 doadores. A estratégia parte do entendimento de que as pessoas doam para pessoas que demonstram paixão por uma causa. Também se baseia na lógica de que o pedido mais eficaz é aquele feito em encontros pessoais, de forma direta e entre pares. 

Por isso, as campanhas contam com o papel essencial de pessoas de prestígio e influência que abrem portas, oferecem credibilidade e aproximam potenciais doadores. “As campanhas de capital são discretas. O dinheiro grande se pede em uma mesa pequena, não em redes sociais. Nosso trabalho é colocar as pessoas certas nessa mesa”, resumiu Naranjo. 

Critérios de prontidão e pesquisa de percepções

Antes de lançar uma campanha de capital, é necessário avaliar se a organização está de fato preparada. “Talvez não estejamos prontos agora e precisemos fortalecer o caso, conseguir amigos que abram portas e trabalhar durante cinco anos antes de lançar uma campanha. Isso é mais barato do que investir todos os recursos da organização em um esforço para o qual não estamos preparados”, afirmou Naranjo.

Para isso, existe o chamado Índice Dove, que mensura uma série de critérios em uma escala de 1 a 10. Entre os pontos avaliados estão o apoio da diretoria e da equipe executiva, a existência de um plano estratégico, um caso persuasivo que justifique a campanha, a presença de lideranças voluntárias engajadas, a competência da equipe de captação e a disponibilidade de grandes doadores potenciais.

Três fatores são considerados decisivos: ter um bom caso, contar com voluntários líderes adequados e dispor de doadores capazes de assumir as principais contribuições. Uma organização está pronta quando atinge 75 pontos ou mais no índice, sendo necessário também que os três critérios principais somem pelo menos 25 pontos.

Outro elemento no processo é a realização de uma pesquisa de percepção, que avalia fatores externos determinantes para o êxito da campanha. Essa pesquisa identifica o interesse de doadores, mede a imagem da organização, testa a força do caso apresentado e ajuda a definir o tamanho ideal das metas. 

De modo geral, são feitas entrevistas presenciais ou virtuais com doadores atuais, potenciais e representantes de organizações parceiras ou concorrentes. Quando o estudo mostra falta de interesse ou ausência de doadores com capacidade de contribuir em grande escala, a recomendação é adiar a campanha para evitar frustrações. “Com ele, você sabe se pode sair para pedir doações de dez mil ou de um milhão de dólares. Já não é mais opinião do captador, é informação testada”, explicou Naranjo.

A lógica da sequência: de dentro para fora, de cima para baixo

Naranjo enfatiza que as campanhas de capital seguem um princípio sequencial. O movimento começa de dentro para fora, o que significa que diretoria, conselho e equipe devem ser os primeiros a contribuir. Também segue o movimento de cima para baixo, com a busca inicial voltada para as maiores doações. As contribuições iniciais funcionam como exemplo, criam confiança e estimulam outras pessoas a se engajarem. Esse efeito multiplicador é um dos pontos-chave para alcançar a meta.

Embora trabalhosas, campanhas de capital podem marcar a história de uma organização. Além de levantar recursos, consolidam redes de apoio e aumentam a credibilidade institucional.

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