Segundo o júri do projeto Experiências em Inovação Social, criado pela Cepal com apoio da Fundação Kellogg, a relação de equilíbrio entre custos de implementação e benefícios gerados por projetos sociais é determinante para obter apoio do investimento privado.
Os 25 projetos sociais mais inovadores da América Latina escolhidos pelo projeto da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe das Nações Unidas (Cepal) têm outros traços comuns além de promover impactos com ideias novas. Primeiro, aprenderam a relacionar-se com agentes externos, sejam eles organizações doadoras sem fins lucrativos, pessoas que aportam recursos individualmente, empresas privadas e governos – locais e nacionais. Em segundo lugar, apresentam uma relação entre custos e benefícios apurados para produzir o bem melhor que as alternativas tradicionais. Sem cumprir estes requisitos, os projetos não teriam se viabilizado, na opinião dos jurados da iniciativa, Francisco Tancredi e Norah Rey de Marulanda.
”Este aspecto deveria merecer especial atenção de parte dos formuladores de políticas públicas, das organizações sem fins lucrativos e também das instituições internacionais que tradicionamente apoiam iniciativas desse tipo”, dizem.
De 17 a 19 deste mês, a Cepal reuniu os 25 projetos ganhadores no seminário “Inovações Sociais na América Latina”, realizado no Instituto das Américas da Universidade Califórnia San Diego (UCSD), nos Estados Unidos.
O encontro permitiu que os projetos se conhecessem, trocassem experiências, discutissem a formação de redes e debatessem as transformações com um público formado por pesquisadores acadêmicos – estudantes e professores –, formuladores de políticas públicas americanos, caribenhos e latino-americanos, representantes de governos e jornalistas dos países da região.
Os 25 projetos ganhadores são provenientes da Argentina (5), Belize (1), Bolívia (1), Brasil (7), Chile (2), Colômbia (1), Costa Rica (1), Equador (2), Guatemala (1), Haiti (1), México (1), Paraguai (1) e Peru (1).
Segundo a diretora do projeto Experiências em Inovação Social, María Elisa Bernal, o principal mérito da iniciativa tem sido dar visibilidade ao empreendedorismo social. “Graças a isso, a Cepal também pode cumprir melhor um de seus mandatos: sugerir políticas que reduzam a pobreza e a desigualdade na região. E, desta vez, a partir do aprendizado de experiências que nasceram na base da sociedade”, afirma.
Um dos projetos que simbolizam a capacidade empreendedora das organizações da sociedade civil é o Observatório Social de Maringá (PR), criado a partir da aliança entre entidades locais e voluntários para controlar o uso dos recursos públicos do município. “Vistoriamos as licitações e compras da prefeitura com a ajuda de técnicos contratados, empresários, estudantes, profissionais, aposentados e donas de casa”, diz a coordenadora do Observatório, Michelle Shimoda. “Paralelamente a isso, fazemos um trabalho de educação nas escolas públicas e privadas com vistas a explicar a importância dos impostos como fonte de criação de serviços e a sua correta aplicação.”
O Observatório Social de Maringá nasceu como resposta da sociedade civil à denúncia, em 2005, do desvio de cerca de 60 milhões de dólares pelo prefeito em exercício e membros do secretariado municipal. Graças ao controle realizado pela cidadania, desde então foram economizados 12 milhões de dólares em compras de produtos pela prefeitura. “Na maioria das vezes, conseguimos impedir a compra pelo maior preço. Mas houve casos também de licitações suspeitas que logramos cancelar e restituir o valor a mais que já havia sido aos cofres municipais.”
Apesar de bem-sucedido em relação aos objetivos propostos, o futuro do projeto Experiências em Inovação Social depende da captação de novos financiadores. “A Fundação Kellogg deu o impulso inicial e apoiou esta iniciativa nestes primeiros seis anos de vida, e em 2011 contribuirá com a divulgação dos 25 projetos ganhadores”, diz Francisco Tancredi. “Agora, a Cepal busca ampliar esta aliança com a conquista de novos parceiros que aportem recursos privados.”
Histórico do projeto
Em 2003, dois anos antes de a Fundação Kellogg completar 75 anos de vida, o Conselho de Administração da organização discutiu a sugestão do escritório brasileiro, à época localizado no bairro de Alphaville, na Região Metropolitana de São Paulo, de criar um prêmio capaz de identificar e dar visibilidade a projetos sociais inovadores desenvolvidos na América Latina e o Caribe. Com a iniciativa, além de celebrar o próprio aniversário, a Kellogg demonstraria o peso que dava ao apoio a organizações da sociedade civil da região em sua programação.
Nessa época, a fundação dotava cerca de 25 milhões de dólares anualmente para aplicar na programação latino-americana e caribenha.
Faltava identificar um parceiro a quem propor a montagem e administração do projeto. A Cepal foi a escolhida, basicamente por dois motivos: credibilidade, por ter se tornado referência para governos, pesquisadores acadêmicos e organizações da sociedade civil; e capacidade de convocatória. Segundo Francisco Tancredi, que atuou como diretor para a América Latina e o Caribe de 1999 a 2008, a parceria se consolidou rapidamente. Em uma reunião com o então Secretário Executivo da Cepal, José Antonio Ocampo, ficou definido que o projeto também teria como ambição contribuir para que as práticas locais de inovação se tornassem políticas públicas, ampliando o seu impacto.
Para viabilizar o projeto, a Fundação Kellogg doou 5 milhões de dólares à Cepal. Com este valor, foi possível realizar os primeiros cinco ciclos anuais do prêmio, oferecendo um recorte amplo das iniciativas com capacidade de reduzir a pobreza. O júri do projeto foi formado por representantes de agências multilaterais e de programas de desenvolvimento dirigidos à região.
Oito critérios foram estabelecidos para avaliar os projetos selecionados: inovação; relação entre custos e resultados; potencial de replicação; potencial de transformação em política pública; efeitos sobre as causas da pobreza; potencial para reduzir a discriminação e a exclusão; desenvolvimento de responsabilidade social; e potencial de sustentabilidade.
Este conjunto de fatores determinou, primeiro, os 72 projetos finalistas dos cinco ciclos do programa, e, finalmente, os 25 ganhadores, classificados do primeiro ao quinto lugares. Além de um prêmio em dinheiro, cujo uso deveria ser necessariamente revertido em melhorias para o projeto, os ganhadores receberam uma certificação conferida por essa agência das Nações Unidas.
No seminário realizado em San Diego, de 17 a 19 de novembro, os projetos foram unânimes em afirmar que o reconhecimento da Cepal tem servido de aval para que estabeleçam e/ou renovem alianças e, consequentemente, fortalecido a sua capacidade de captar recursos de financiadores privados e também dos governos locais.
Livro sistematiza experiências
No seminário, ocorreu o lançamento do livro “De la innovación social a la política pública – Histórias de éxito en América Latina y el Caribe”, escrito pelos jurados do projeto Francisco Tancredi e Norah Rey de Marulanda. Editada em espanhol e inglês, a publicação será lançada em português nos próximos meses.
Para baixar a versão em espanhol, em PDF, clique aqui.
Para baixar a versão em inglês, em PDF, clique aqui.