Nos dias 23 e 24 de setembro, o Panamá recebeu a primeira Jornada de Filantropia e Generosidade para Líderes de Latinoamérica, organizada pelo GivingTuesday para América Latina e Caribe em parceria com o Día de las Buenas Acciones. O evento contou com a presença de mais de 100 lideranças de vários países da região, incluindo Carol Farias, líder do Dia de Doar no Brasil, liderado pela ABCR, e representantes de campanhas comunitárias e organizações brasileiras.
“A minha participação na Jornada de Generosidade e Filantropia foi uma experiência muito positiva, tive a oportunidade de me capacitar e trocar e fazer network com líderes de vários países e hoje me sinto capacitada para realizar a caminhada comunitária que terá como tema Doar Faz Bem, nos estados da Paraíba, Rio de Janeiro e São Paulo, e que terá participação de 130 a 150 instituições. A palavra é gratidão à ABCR, ao João Paulo Vergueiro, à Carol Farias e a toda a comitiva brasileira pela troca e pela participação ativa no evento”, conta a diretora de Expansão e Captação de Recursos do Instituto Nacional de Desenvolvimento Humano (INADH), Gisele Silva.
João Paulo Vergueiro, diretor do GivingTuesday LAC Hub, fez a abertura do evento, destacando a importância do encontro presencial. “Esta é a primeira vez que realizamos um evento público presencial na América. Temos quase dois anos realizando atividades on-line, mas reunir-nos fisicamente para falar de generosidade é realmente diferente, e até um pouco inusitado, depois dos difíceis anos de pandemia que todos vivemos. Não é possível mudar o mundo se só nos encontramos on-line, sem nos vermos, nos abraçarmos ou sorrirmos uns para os outros. E somos latinos, gostamos de nos encontrar, de dançar, de nos ver.”
João Paulo também sublinhou o significado do evento para a construção de um modelo de filantropia próprio para a região. “O que estamos fazendo hoje é plantar uma pequena semente da muito necessária integração latino-americana para construir nosso próprio modelo de filantropia e generosidade, e não copiar os modelos externos. Estamos fazendo história juntos”.
A programação incluiu sessões como “Experiencias Nacionales de Generosidad”, com palestrantes de México, Peru, Colômbia e República Dominicana, e um workshop sobre inteligência artificial e generosidade, com Ronen Ozover, do México, e Jonathan Urbina, da Costa Rica. Durante o painel “Fomentando la Filantropía”, Marina Pechlivanis representou o Brasil em um debate sobre oportunidades e movimentos para fortalecer a filantropia na região.
No painel “Experiencias Nacionales de Generosidad”, lideranças de quatro países compartilharam suas lições e estratégias para promover a generosidade. Participaram do painel Lilian Fernández (México), Karol Rottiers (Peru), João Paulo Vergueiro representando a Diana Cano (Colômbia), e Pablo Viñas (República Dominicana), cada um trazendo histórias e práticas de sucesso que têm impactado suas comunidades.
Lilian Fernández, à frente do movimento Día de las Buenas Acciones em Aguascalientes, compartilhou o impacto transformador do voluntariado na comunidade. Ela relatou como sua organização, através de campanhas de Natal, já entregou mais de 1.500 presentes para crianças de comunidades em situação de vulnerabilidade, um trabalho que exige grande organização e dedicação. Ela destacou a importância de incutir a generosidade desde a infância, criando futuros cidadãos generosos, e contou a história de famílias beneficiadas pelo programa que, posteriormente, se tornaram voluntárias ativas, como o caso de Pati e sua família, que agora ajudam a organizar os eventos e atividades.
Karol Rottiers, coordenadora do Día de las Buenas Acciones no Peru, apresentou a trajetória do movimento no país, onde atuam há três anos. A organização, que serve como uma plataforma articuladora entre organizações, empresas e voluntários, tem impactado milhares de pessoas, mobilizando mais de 3.000 voluntários em mais de 60 projetos somente em 2023. Ela ressaltou também que o Peru está ampliando seu impacto para além da capital Lima, alcançando regiões da selva, costa e montanhas.
Pablo Viñas, líder do movimento Giving Tuesday na República Dominicana, compartilhou como, desde 2014, o país vem celebrando a generosidade por meio dessa campanha global. Ele contou sobre os desafios iniciais de alinhar a missão da sua organização com o movimento e como, ao longo dos anos, o trabalho de promoção do altruísmo e da filantropia foi ganhando força.
Um dos projetos mais memoráveis foi uma campanha de doação de sangue, que não apenas mobilizou voluntários, mas também desmistificou a ideia de que a generosidade está restrita à doação financeira. Viñas também destacou a importância de articulação com a imprensa para dar mais visibilidade ao movimento e de capacitar organizações parceiras para que promovam suas próprias ações de generosidade.
João Paulo Vergueiro representou Diana Cano, líder de Giving Tuesday na Colômbia, e falou sobre como o país foi o primeiro na América Latina a registrar o movimento localmente com a criação da organização Un Día para Dar Colombia. Ele explicou que, apesar de recente, o movimento já conta com mais de 500 membros e 30 embaixadores, que promovem a generosidade em várias regiões do país. Além disso, Vergueiro mencionou o impacto de iniciativas como o Colectivo Estornino, um programa de formação para líderes de generosidade, e o projeto 17 Cuartos, que aproximou o governo colombiano da sociedade civil para trabalhar em conjunto nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Durante a Jornada, Anita Gallagher, do México, liderou a palestra “Data Walk: Esparciendo Generosidad en LATAM”, em que destacou a importância de utilizar dados para entender e expandir a cultura da generosidade na América Latina. O formato inovador da palestra combinou apresentação teórica e uma caminhada interativa, permitindo aos participantes explorar de forma prática como os dados podem transformar suas estratégias filantrópicas.
Anita começou destacando que, no movimento GivingTuesday, os dados são essenciais para entender os comportamentos de doação e as mudanças nas relações de generosidade ao redor do mundo. “Para sermos mais eficazes e termos maior capacidade de mudar o mundo, precisamos conhecer como as pessoas doam, seja dinheiro, objetos, tempo ou até mesmo suas vozes. Os dados nos ajudam a tomar decisões informadas e a fortalecer a mobilização de recursos”.
Anita explicou que a equipe global do GivingTuesday conta com cientistas de dados que, diariamente, monitoram e analisam o comportamento de generosidade em mais de 40 países. Ela também compartilhou que, em outubro, será lançado o primeiro relatório de dados sobre generosidade na América Latina e no Caribe, abrangendo 12 países. O estudo vai oferecer uma visão detalhada de como a generosidade se manifesta na região, apontando semelhanças e diferenças entre os países.
Após essa introdução, os participantes foram convidados a uma caminhada interativa pelos dados, em que puderam visitar várias estações com gráficos e visualizações sobre comportamentos de doação em diferentes países. A ideia era que os participantes analisassem os dados e refletissem sobre como esses números impactam suas próprias comunidades e iniciativas filantrópicas.
Durante as discussões, emergiram reflexões importantes. Um dos temas debatidos foi como o envolvimento das pessoas em atos de generosidade vai além da doação de dinheiro. Em muitos países da América Latina, como México e Brasil, há um crescente aumento na doação de tempo e objetos, além do dinheiro. Anita destacou a importância de incentivar a doação de várias formas, adaptando as estratégias para engajar mais pessoas.
No final da caminhada, Anita deixou uma mensagem para os participantes. “Os dados contam histórias. Eles são uma forma poderosa de comunicação e nos ajudam a medir o que é mais valioso para nós. A pergunta que fica é: qual a história que você quer contar? E quais dados você precisa para comprová-la?”.
O painel “La Generosidad no es un Acto Fortuito” foi uma das sessões mais reflexivas da jornada, destacando a importância da dedicação pessoal e do compromisso contínuo para que o voluntariado gere impacto duradouro. O painel reuniu Carlos Madrid (México), Romina Pérez (Paraguai) e Julio Salas (Equador), que compartilharam suas experiências e reflexões sobre como a generosidade se desenvolve ao longo da vida e seu impacto nas comunidades.
Julio Salas iniciou o debate abordando como sua trajetória pessoal influenciou seu envolvimento no voluntariado. Ele destacou como o movimento escoteiro e o trabalho em igrejas desde a infância moldaram seu compromisso com causas sociais. “Eu fui escoteiro porque meus pais foram escoteiros, e isso gerou uma relação interessante com o voluntariado. Aos 15 anos, já estava dando catequese em um setor perigoso de Guayaquil e, a partir daí, segui me envolvendo em iniciativas sociais. Esse compromisso voluntário, que começou na infância, continuou de forma natural ao longo da minha vida”.
Romina Pérez, representando o Paraguai, compartilhou como o voluntariado faz parte de sua vida há mais de 20 anos, apesar da falta de estrutura formal em seu país. Ela comentou sobre a cultura do voluntariado no Paraguai e o espírito solidário que prevalece mesmo sem grandes organizações por trás das ações.
“No Paraguai, não temos grandes estruturas para o voluntariado. Muitas vezes, apenas fazemos. A garra paraguaia é o que nos move, como no futebol, começamos de forma simples e com o que temos. Por exemplo, no nosso projeto Mascotando, que conecta famílias com animais em situação de rua, conseguimos mobilizar mais de 70 voluntários. A motivação e a generosidade de cada um são fundamentais”, disse Romina.
Carlos Madrid encerrou o painel trazendo uma perspectiva institucional e filosófica sobre a generosidade. Ele destacou a importância de se cultivar uma cultura de filantropia baseada em princípios claros e a necessidade de responsabilidade e transparência nas ações voluntárias. Para ele, a generosidade não é apenas uma ação espontânea, mas sim uma prática estruturada. “A generosidade não consiste apenas em dar coisas, mas em oferecer o que temos de mais valioso: o tempo. Como disse Manuel Arango, o dinheiro é recuperável, mas o tempo, uma vez dado, não volta. A verdadeira generosidade está em se comprometer com as causas e com as pessoas ao longo do tempo”.
A programação foi finalizada com uma palestra sobre fomento à filantropia, com participação de Marina Pechlivanis, fundadora da Educação para Gentileza e Generosidade, representante do Giving Tuesday Spark no Brasil, e do Dia de Doar Kids. Ela apresentou a Semana Nacional de Educação para Gentileza e Generosidade (EGG), que ocorre de 1º a 7 de outubro e promove valores como gentileza, generosidade, sustentabilidade, diversidade e cidadania. A iniciativa tem apoio da ABCR e oferece materiais gratuitos, como manuais, pesquisas e kits de divulgação, além de eventos presenciais e virtuais. A 3ª edição também destaca o Prêmio Educação para Gentileza e Generosidade Escolas e parcerias com diversas instituições. O projeto, que integra escolas, famílias, jovens e empresas, visa conscientizar sobre o impacto desses princípios para o bem-estar social e a saúde mental.
Para saber mais sobre o GivingTuesday LAC Hub e ficar por dentro de ações e evento, acesse www.givingtuesday.org/latinamerica-caribbean
Texto: Stephane Sena