No segundo e último dia de programação aberta do 4º Encontro de Comunicação e Captação de Recursos, que recebeu 1.800 inscrições, as palestras abordaram temas como parcerias com influenciadores, o potencial inexplorado das leis de incentivo, aplicação de IA na comunicação e captação de recursos e o papel de grandes audiências para fortalecer OSCs. Na palestra “Valorizando a Profissão da Captação”, Carla Nóbrega e Flávia Lang compartilharam suas trajetórias e reflexões sobre os desafios, conquistas e avanços da captação de recursos no Brasil.
Carla Nóbrega iniciou o bate-papo refletindo sobre o começo de sua carreira na Fundação SOS Mata Atlântica, em uma época em que a captação de recursos era pouco conhecida e escassamente estruturada. Segundo ela, “naquela época, a captação de recursos era uma coisa que era muito rara”, e relembrou que sua sorte foi começar em uma organização que já possuía um departamento dedicado à captação, o que era incomum. Ela destacou ainda como foi importante o passo de fundar a ABCR para dar visibilidade e legitimidade à profissão, algo que no início era difícil de ser compreendido.
Flávia Lang, por sua vez, compartilhou sua experiência no Greenpeace e relembrou como o apoio da organização a capacitações foi essencial para seu crescimento na profissão. “Como a Carla, eu amo a minha profissão, eu amo ser captadora de recursos, eu acho que a gente tem que ter muito orgulho daquilo que a gente faz, porque a gente realmente causa impacto”, afirmou. Para Flávia, a captação de recursos é um trabalho transformador que, ao fortalecer as organizações, possibilita mudanças significativas na sociedade.
Durante a conversa, ambas discutiram a evolução da profissão de captador de recursos no Brasil, abordando os desafios que foram enfrentados para torná-la uma carreira reconhecida. Carla destacou o processo de criação do primeiro código de ética da ABCR, inspirado em associações de captadores dos Estados Unidos e do Reino Unido. Esse código foi um marco importante para estabelecer padrões éticos e profissionais, incluindo formas recomendadas de remuneração e os direitos dos doadores.
“Fundamos a ABCR em dezembro de 1999, na qual eu tive a honra de ser a primeira vice-presidente. O Custódio Pereira era o presidente, eu era a vice, sempre como voluntária”, recordou Carla, ressaltando o orgulho que sente pela profissão e pelas conquistas ao longo dos anos.
A formalização da profissão também foi um grande avanço. Em certo momento, Carla mencionou a inclusão da captação de recursos no Código Brasileiro de Ocupações (CBO), oficializando-a como uma profissão reconhecida pelo governo, uma grande conquista da ABCR. Flávia complementou: “É importante você ter um departamento de captação, como é importante você ter captadores de recursos e como é importante você desenvolver, não só os captadores dentro da organização, mas os relacionamentos, porque captação de recursos não é algo pontual, ele é uma coisa de longo prazo, ele é um processo”.
Um ponto forte da palestra foi a transformação trazida pelos avanços tecnológicos, que facilitaram significativamente o trabalho dos captadores de recursos. Carla relembrou o tempo em que trabalhava com banco de dados dos doadores armazenado em disquetes e o quanto os métodos de pagamento eram rudimentares. “Eu tinha o banco de dados dos doadores em uns disquetes ainda, que eram grandes e moles, e eu levava o backup para minha casa, porque eu ficava pensando, ‘nossa, se pegar fogo aqui, vai perder todos os dados dos captadores’”. Flávia acrescentou que, atualmente, a captação on-line e o uso de CRMs e automação de e-mails revolucionaram a comunicação e gestão dos dados, facilitando o relacionamento com os doadores.
As palestrantes também compararam a evolução das estratégias de captação, como o face-to-face. Flávia lembrou que, quando essa modalidade foi introduzida, os dados dos doadores eram coletados em formulários de papel, enquanto hoje os captadores utilizam tablets e cobram as doações diretamente na rua. Esse avanço, segundo elas, contribuiu para tornar o processo mais rápido e eficiente, permitindo que o captador mantenha um relacionamento mais próximo e direto com os doadores.
Carla e Flávia enfatizaram a importância de toda a organização entender e valorizar o trabalho do captador de recursos, evitando isolar esse departamento como se fosse o único responsável pelo financiamento dos projetos. Segundo Carla, é fundamental que o captador de recursos seja visto como um “ponte” entre a organização e o financiador, e que todos na organização participem desse processo de captação de alguma forma. Ela mencionou que muitas organizações ainda encaram a captação de recursos como uma função acessória, quando na verdade deveria ser integrada e entendida como parte essencial da missão da instituição.
As palestrantes também incentivaram os gestores e conselheiros a se envolverem na captação de recursos. “É importante que os gestores, os diretores executivos, se envolvam na captação, até porque ele tem outro nível de relacionamento que a gente às vezes não tem como profissional da captação de recursos”, observou Carla. Além disso, elas mencionaram a necessidade de os gestores perderem o receio de fazer pedidos de doação, lembrando que a captação é uma forma de ajudar a realizar a missão da organização e não um pedido pessoal.
Ao final da palestra, Carla e Flávia reforçaram o valor da ABCR e da rede de apoio que ela oferece aos profissionais de captação de recursos no Brasil. Com 25 anos de existência, a ABCR se tornou um ponto de encontro e de troca para os captadores, com eventos como o Festival ABCR, que hoje é o maior evento de captação de recursos da América Latina.
Encerrando a palestra, Flávia convidou os participantes a continuarem valorizando e desenvolvendo a profissão de captador de recursos, que é essencial para o fortalecimento das organizações e a transformação social. Para Carla e Flávia, o futuro da profissão depende da colaboração, da troca de conhecimento e do reconhecimento de que a captação de recursos é um pilar estratégico dentro das organizações.