A Câmara dos Deputados aprovou, na quarta-feira (10), o texto que regulamenta a Reforma Tributária, tratando da implementação de novos impostos que vão substituir os atuais tributos federais. . O texto-base foi aprovado com 336 votos favoráveis, 142 contrários e 2 abstenções, incluindo a eliminação do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD) para as Organizações da Sociedade Civil (OSCs), uma antiga reivindicação da ABCR. A proposta vai para o senado e, se passar pela sanção presidencial, doações ou transmissões de bens para OSCs não precisarão mais pagar o ITCMD, desonerando essas instituições e facilitando o fluxo de recursos para suas atividades.

A eliminação do ITCMD é fundamental para o fortalecimento das OSCs, que desempenham papéis essenciais na promoção de direitos, assistência social, educação e outras áreas. A isenção tributária sobre doações era uma demanda histórica do setor, que via na taxação um desincentivo à solidariedade e à filantropia..
Há mais de quatro anos, a ABCR lidera uma batalha incisiva contra a cobrança do ITCMD sobre as doações destinadas às OSCs. “Adotamos a questão do ITCMD como nossa bandeira de mudança, liderando iniciativas para fortalecer o ecossistema e garantir a sustentabilidade das organizações”, destacou o diretor executivo da ABCR, Fernando Nogueira.
Fomento à solidariedade
Em junho deste ano, a ABCR intensificou suas ações de advocacy em Brasília, compondo a Aliança pelo Fortalecimento da Sociedade Civil, que inclui ABCR, ABONG, Aliança pelos Investimentos e Negócios de Impacto, APF, Dinamo, Fundação José Luiz Egydio Setúbal, GIFE, ICE, IDIS, Instituto Beja, Liga Solidária, Movimento Arredondar, Movimento Bem Maior, PDR – Fundo Filantrópico e Sitawi, com apoio jurídico dos escritórios Mattos Filhos, Pannuzio Trezza Advogados, Pinheiro Carrenho, PLKC Advogados e Szazi Bechara Storto Reicher Figueiredo Lopes Advogados.
A coalizão de organizações participou de reuniões estratégicas com representantes do executivo e do legislativo, incluindo um encontro com o deputado Reginaldo Lopes, coordenador do Grupo de Trabalho sobre a Reforma Tributária na Câmara, audiência com a procuradora-geral da Fazenda Nacional, Anelize de Almeida, audiência pública na Câmara dos Deputados e diálogos com deputados de diversas frentes e temáticas.
No dia 19 de junho, Fernando Nogueira participou de uma audiência pública em defesa da imunidade de imposto sobre doações. Também estiveram presentes Eduardo Szazi, consultor jurídico do GIFE; Priscila Pasqualin, advogada e representante do Instituto Beja; e Romi Márcia Bencke, membra do Conselho Diretor e do Conselho de Ética da ABONG. O objetivo da audiência foi discutir a reforma tributária e suas implicações para o terceiro setor, trazendo abordando pontos críticos que afetam diretamente a sustentabilidade das organizações no Brasil.


“Até hoje, o Brasil é um dos poucos países no mundo que tributa doações. A grande maioria dos países tem legislações que incentivam a solidariedade, enquanto no Brasil, até hoje, até a regulamentação da reforma, ainda se tributa um valor, o que dificulta a doação, desincentiva a doação e a solidariedade”, explicou Nogueira, destacando a importância da pauta da aliança: “solidariedade não se tributa, solidariedade não se complica, não se dificulta.”
O diretor executivo da ABCR também evidenciou que a sustentabilidade financeira das organizações da sociedade civil é fundamental para a construção de uma sociedade justa e solidária. “Temos 820 mil organizações e mais de 6 milhões de trabalhadores dedicados a erradicar a pobreza e as desigualdades. A legislação tributária deve ser adequada para permitir que essas atividades continuem a ser prestadas”.
Romi Márcia Bencke disse que a solidariedade não deve ser complicada. “O Brasil é um país onde, infelizmente, temos uma grande dificuldade de captação de recursos. No Brasil, não existe uma mentalidade de doação. As organizações já têm uma série de dificuldades de captar recurso. Acredito que não podemos tributar solidariedade, não podemos tributar liberdade de associação, não podemos impedir que a sociedade civil se organize, porque quem perde com isso é o Brasil”.


Romi também reforçou a importância das pequenas organizações na promoção do bem comum e na assistência à população vulnerabilizada. “Na grande maioria das vezes, são essas pequenas organizações que conseguem chegar a lugares em que o Estado não chega. Eu pergunto o que seria de estados com grandes dimensões, por exemplo, os estados da Amazônia brasileira, se não houvesse pequenas organizações, pequenos coletivos organizados para desempenhar papéis relevantes de assistência à população vulnerabilizada”.
Código Tributário Nacional e remuneração de dirigentes
Priscila Pasqualin destacou o papel fundamental das organizações da sociedade civil em situações de emergência e a necessidade de facilitar, e não complicar, a solidariedade. Ela explicou que a proposta de alteração do Código Tributário Nacional (CTN) que exigiria auditoria independente para a maioria das organizações é onerosa e desnecessária.
“Onera as instituições médias e pequenas, trazendo a obrigação para a maioria das instituições de ter uma auditoria independente, o que é custoso para as organizações”, disse Pasqualin. Além disso, ela argumentou que a alteração do CTN que complica a doação onerosa prejudica a capacidade das organizações de garantir que os recursos doados sejam utilizados conforme o interesse do público e dos doadores.
Pasqualin também criticou a proposta de limitar a remuneração de dirigentes de organizações da sociedade civil ao teto do servidor público federal, argumentando que isso não leva em conta as diferentes naturezas das contratações e remunerações entre o setor público e privado. “A proposta é que se equipare a remuneração de dirigentes estatutários e não estatutários de organizações da sociedade civil à remuneração do teto do servidor público federal, como uma regra objetiva. Porém a forma de contratação das instituições sem fins lucrativos segue o regime de direito privado, portanto, temos que seguir a CLT, temos que seguir os dissídios coletivos. É uma lógica completamente diferente da lógica da remuneração do servidor público”, explicou.
Graças à forte articulação e ação coletiva dos representantes da sociedade civil organizada, foi possível evitar que essa proposta fosse aprovada. Essa vitória foi essencial para preservar a capacidade de operação e o impacto positivo das organizações sem fins lucrativos, garantindo que a solidariedade e o trabalho em prol do bem comum continuem a ser facilitados e não complicados.
“Barrar essa proposta mostra o poder da ação coletiva da sociedade civil. Ao nos unirmos, conseguimos nos fazer ouvir e proteger nossos direitos, assegurando que as organizações possam fazer seu trabalho sem obstáculos desnecessários. A união de vozes fortalece nossa capacidade de influenciar políticas públicas”, avalia Fernando Nogueira.
A gravação da audiência pública está disponível no Youtube:
Próximos passos
Com a aprovação na Câmara, a proposta de regulamentação da Reforma Tributária segue agora para o Senado. A expectativa é que a casa revisora mantenha as conquistas obtidas até aqui, garantindo que o fim da taxação sobre doações para OSCs seja efetivado. Após a aprovação no Senado, o texto será enviado para sanção presidencial.
A abertura de diálogo com o governo e o Congresso Nacional, liderada pela ABCR e a Aliança pelo Fortalecimento da Sociedade Civil, é um passo fundamental para que o Terceiro Setor veja suas pautas atendidas. “O fim do ITCMD é um estímulo tangível para as doações, promovendo um ambiente mais propício ao desenvolvimento contínuo das OSCs em direção a uma sociedade mais justa e solidária”, conclui Fernando Nogueira.